A Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE) recebeu em 2024 mais de duas mil comunicações de empresas referindo que não iriam renovar um contrato de trabalho a termo ou pretendiam despedir mulheres grávidas, puérperas, lactantes, pessoas em gozo de licença parental ou cuidadoras. Estas comunicações estão determinadas por lei para protecção de direitos das mulheres. O número é o mais elevado desde 2020, ano muito marcado pela pandemia, e tem estado sempre em subida.
É sabido que a situação
portuguesa no que respeita aos nascimentos e renovação geracional continua a
agravar-se e estes dados são indiciadores dados obstáculos à maternidade e
contribuem para o agravamento da dificuldade de renovação demográfica.
Como aqui escrevia há algum
tempo, Portugal integra o grupo com menores apoios sociais para que os pais
fiquem mais tempo em casa com filhos pequenos sendo que sobretudo nas zonas
mais urbanas, (o interior desertifica-se o que também contribui para a baixa
natalidade), a oferta de estruturas formais de acolhimento de bebés e crianças
é ainda insuficiente. Acresce que Portugal tem um dos mais elevados custos de
equipamentos e serviços para crianças.
O emprego jovem e a sua
estabilidade e rendimento torna muito difícil assumir o encargo dos filhos agravado
por, como se verifica pela notícia, obstáculos à maternidade de mulheres
empregadas.
Importa ainda não esquecer a
discriminação salarial de que muitas mulheres, sobretudo em áreas de menor
qualificação, são ainda alvo e a forma como a legislação laboral e a sua
“flexibilização” as deixam mais desprotegidas. São conhecidas muitas histórias
sobre casos de entrevistas de selecção em que se inquirirem as mulheres sobre a
intenção de ter filhos, sobre casos de implicações laborais negativas por
gravidez e maternidade, sobre situações em que as mulheres são pressionadas
para não usarem a licença de maternidade até ao limite, etc. Existem empresas que
exigem às mulheres um compromisso de que não irão engravidar nos próximos 5
anos. Não adianta argumentar com o quadro legal existente ou que venha a
existir. Em Portugal a lei tem mais um carácter indicativo que imperativo.
O fluxo de emigração jovem nos
últimos anos é elevado e é pouco provável que se verifique o retorno da maioria
que emigrou.
Por outro lado, em tempos
altamente competitivos com a proletarização do trabalho com salários baixos e e
nas prestações sociais insuficientes, as pessoas hipotecam os projectos de vida
em troca das migalhas que permitam a sobrevivência o que lhes retira margem
negocial ou liberdade de escolha.
A fiscalização e regulação são
insuficientes, uso e abuso de estágios não remunerados ou miseravelmente pagos
e que não asseguram continuidade, condições de trabalho degradantes cuja não
aceitação implica a perda do lugar em troca por alguém ainda mais necessitado
e, portanto, calado.
A promoção de projectos de vida
familiar que incluam filhos implica, necessariamente, intervir nas políticas de
emprego e protecção do emprego e da parentalidade, na discriminação e combate
eficaz a abusos e a precariedade ilegal, na inversão do trajecto de
proletarização com salários que não chegam para satisfazer as necessidades de
uma família com filhos e custos elevados na educação apesar de uma escolaridade
dita gratuita, na fiscalidade, por exemplo. A questão é que a política que tem
vindo a ser seguida não permite acreditar que existam alterações.
É ainda urgente que se promova a
estabilidade de emprego a acessibilidade real (na distância e nos custos) aos
equipamentos e serviços para a infância com o alargamento da resposta pública
de creche e educação pré-escolar, cuja oferta está abaixo da meta estabelecida.
É uma questão de futuro.
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