A propósito da divulgação da
publicação de mais de 100 artigos científicos falsos, produzidos por um
programa informático, que terão sido publicados passando pelo filtro do
"peer review", algumas notas mas começando um pouco mais atrás.
Há algum tempo, numa iniciativa
da Universidade Católica de Braga foi divulgado um estudo envolvendo sete
países sobre as questões do plágio, segundo o qual, entre 40 e 60% dos alunos do
ensino secundário admitiram ter recorrido a tal procedimento.
De facto, o plágio é um fenómeno
em alta também no ensino superior, realidade que conheço melhor, mas não
só, a título de exemplo já tive textos do blogue plagiados. Considerando o
volume crescente de situações muitas instituições têm vindo a adoptar
dispositivos de despiste e regulamentos que minimizem o risco de tais práticas.
É verdade que de há uns tempos
para cá, felizmente, tem vindo a emergir e entrar na agenda a questão da
utilização da informação disponível, designadamente na net, na produção
fraudulenta ou nos limites da ética de trabalhos académicos e científicos da
mais variada natureza como é o caso dos artigos científicos falsos agora
divulgado e que não constitui, aliás, o primeiro caso.
Neste âmbito, conheceu-se até a primeira situação em Portugal, creio, de uma Tese de Doutoramento apresentada na
Universidade do Minho e anulada por motivo de plágio. O Centro de Estudos
Sociais da Faculdade Economia da U. de Coimbra tem vindo a desenvolver um
estudo nacional sobre a questão da fraude académica cujos dados iniciais
apontavam no sentido de que de que 37.6 % dos inquiridos aceita a fraude desde
que “não prejudique ninguém”. A estes dados, pode acrescentar-se um estudo da
Universidade do Minho há tempos divulgado referindo que as situações de algum
tipo de “copianço” envolvem três em cada quatro estudantes.
Este reconhecido aumento das
situações de plágio que se verificam em todos os níveis de ensino, do básico à
formação pós-graduada, doutoramentos incluídos, bem como artigos científicos,
situação hoje bem retratada, elucida o que costumo designar por relação ética
que estabelecemos com o conhecimento e que os alunos mais novos replicam.
Aliás, no estudo da U. do Minho, dos alunos que admitiam copiar, 90 % afirmavam
fazê-lo desde sempre.
O conhecimento será entendido
como algo que se deve mostrar para justificar uma nota ou estatuto, não para
efectivamente integrar e, ou acrescentar uma mais-valia científica, ou seja,
importante mesmo é que a nota dê para passar, que o curso se finalize, que a
tese fique feita e se seja doutorado ou que se possa acrescentar mais um artigo
à produção científica num mundo altamente competitivo, muitíssimo competitivo.
Que tudo isto possa acontecer à custa da manhosice, do desenrasca mais ou menos
sofisticado, são minudências com as quais não podemos perder tempo.
É importante termos consciência
que esta questão não é um exclusivo nosso, a notícia que serve de mote a este
texto mostra isso com clareza. De qualquer forma, não deixa de ser uma
preocupação e justifica que as escolas, do básico ao superior, se envolvam
nesta tentativa de que todos tenhamos uma relação sólida do ponto de vista ético
com o conhecimento, a sua produção e divulgação.
O caminho passa pelo
estabelecimento obrigatório de códigos de conduta com implicações
sancionatórias severas e com uma atitude formativa e preventiva durante as
aulas.
O trabalho será sempre difícil
pois o actual contexto ao nível dos valores e da ética dos comportamentos e
funcionamento social é, só por si, um caldo de cultura onde o copianço, o
plágio ou a fraude científica, por vezes, não passam de "peanuts". É
a cultura do desenrascanço, não importa como.
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