No ano de 2012 nos tribunais
portugueses 752 arguidos escaparam a uma eventual condenação por
prescrição do
crime. É ainda de registar que estes número apenas se refere à prescrição numa
fase do processo pelo que se considerarem todas as fases possíveis os número
subirão.
Nos últimos dias tem sido notícia
a prescrição ou o risco de prescrição em processos envolvendo figuras públicas
ligas à banca e em processos de enorme dimensão e gravidade.
Complementando, entre 2008 e
2010, 5341 arguidos não foram condenados por prescrição dos crimes de que
estavam acusados sendo que em 2009 a prescrição evitou a condenação de 1489
arguidos já condenados em primeira instância.
Recordo um Relatório da OCDE, de
Junho de 2013, que mostrava que em Portugal, um processo demora 425 dias, em média,
a ser resolvido nos tribunais de primeira instância, o segundo mais moroso
antes da Itália.
Neste âmbito, morosidade da
justiça, tem acontecido com alguma frequência a aplicação por parte do Tribunal
Europeu dos Direitos do Homem de multas a Portugal por atraso excessivo na
decisão de um processo judicial.
A própria Ministra da Justiça
afirmou há tempos que em Portugal "ainda existe uma justiça para ricos e
uma justiça para pobres". Esta afirmação apenas surpreende por vir da ...
responsável pela justiça em Portugal o que não quer, evidentemente, significar
da responsável pelo estado a que a justiça em Portugal chegou.
Curiosamente, o Governo já
anunciou que está terminada a reforma da Justiça pelo que podemos imagina o
cenário sem que se tivesse realizado a "reforma" do sistema.
Muitas vezes tenho referido no
Atenta Inquietude que uma das dimensões fundamentais para uma cidadania de
qualidade é a confiança no sistema de justiça. É imprescindível que cada um de
nós sinta confiança na administração equitativa, justa e célere da justiça. Assim
sendo, a forma como é percebida a justiça em Portugal, forte com os fracos,
fraca com os fortes, lenta, mergulhada em conflitualidade com origem nos
interesses corporativos e nos equilíbrios da partidocracia vigente constitui
uma das maiores fragilidades da nossa vida colectiva.
Como todos sabemos e nos
indignamos, quase todos, ecidentemente, são recorrentes a demora, a manha nos
processos judiciais com a utilização de legislação complexa, ineficaz e
cirurgicamente construída para ser manhosamente usada por quem a construiu que,
com base em expedientes dilatórios, promove a injustiça, ou seja, é uma justiça
manifestamente marcada pelas desigualdades de tratamento como a Ministra
referiu, etc. São recorrentes os exemplos que, lamentavelmente, já não nos
surpreendem, não nos sobressaltam. Quando muito, dedicamos-lhe um encolher de
ombros a suportar um pensamento telegráfico, "mais um". Veja-se o que
tem sido o trajecto de alguns processos mais mediatizados.
Parece-me ainda de relembrar um
relatório de 2011, creio que também da Comissão Europeia para a Eficácia da
Justiça no âmbito do Conselho da Europa, que, para além de referir a
morosidade, revelava que, curiosamente, somos um dos países com um rácio maior
de profissionais de justiça por 100 000 habitantes, 294.9, (envolve juízes,
advogados, procuradores e notários). É notável, este facto transmite a ideia
que esta gente toda se atropela, engarrafando processos e procedimentos.
É verdade que foram recentemente
introduzidas alterações no Código Penal e no Código de Processo Penal que, não
sendo um especialista, não consigo avaliar do seu eventual impacto no cenário
actual. No entanto, continuo a entender que não existe uma determinação sólida
e consensual de alteração da teia de ineficiência que é a nossa justiça apesar
da retórica das afirmações. Sofrem os cidadãos individualmente e sofre a
qualidade da vida cívica de um país que percebe o seu sistema de justiça como
forte com os fracos, fraco com os fortes, moroso, ineficaz e, definitivamente
injusto. É mau, muito mau.
Apesar de sucessivos discursos
sobre o que se tem passado ao longo de décadas no sistema de justiça português,
a situação existente fez bater no fundo os níveis de confiança e
credibilidade.