No âmbito do Programa do Governo está contemplada a possibilidade de alargamento do contingente especial previsto no acesso ao ensino superior para alunos de famílias com carências económicas.
Actualmente, o contingente, definido no ano de
23/24, é de 2% das vagas e destina-se a alunos beneficiários do escalão A dos
Apoios Sociais.
Um trabalho, “Avaliação de
Impacto do Contingente Prioritário para Beneficiários de Acção Social Escolar
(ASE-A)", do Edulog, Fundação Belmiro de Azevedo, refere que em 2023 41% dos
alunos do escalão A não teriam conseguido o acesso pois a sua nota de
candidatura era inferior à nota mínima de entrada através do regime geral de
acesso.
No entanto, considerando os 3367
candidatos elegíveis, apenas 43% optaram por se candidatar através do
contingente especial.
Como já aqui tenho escrito, é
habitual considerar-se recorrer a quotas ou contingentes especiais para
minimizar exclusão ou desigualdade, não sendo o ideal, pode ajudar a minimizar
os problemas. A título de exemplo e atentando num outro grupo com contingente
definido e considerando dados de 2017/2018, frequentaram o ensino superior 1644
alunos com necessidades especiais, 0,5% do total dos matriculados no ensino
superior, sendo que apenas 14% das vagas do contingente especial para estes
estudantes foram ocupadas.
Neste contexto, levanta-se uma questão crítica, o
caminho só por aqui é demasiado estreito.
Importa sublinhar que o combate à
desigualdade e a promoção de igualdade de oportunidades se exige desde a
educação pré-escolar e em todo o trajecto escolar com a existência de
dispositivos de apoio suficientes e competentes.
A decisão de continuar para o
ensino superior é construída durante todo o trajecto do básico e secundário.
Percursos com mais sucesso promovem expectativas mais elevadas de alunos e
famílias, valorizam o conhecimento e a qualificação e, portanto, são mais
potenciadores da intenção de continuar a estudar. Donde, é imprescindível um
forte investimento em recursos e dispositivos de apoio que sustentem mais
sucesso para todos os alunos de todas as escolas.
Com maior frequência que noutros
grupos demográficos, as famílias mais vulneráveis expressam também expectativas
mais baixas ou nulas sobre o sucesso escolar dos seus filhos e sobre a
importância de estudar.
Neste contexto seria desejável
trabalho de mediação com recursos competentes e adequados no trabalho com as
famílias no sentido de reajustar expectativas e reconstruir a atribuição
importância ao estudo e à qualificação. As pessoas com baixas expectativas
acomodam mais facilmente o insucesso, é o “destino”, aprendem a viver com essa
“fatalidade” o que lhes tranquiliza a forma como olham para si e para os seus
filhos.
As famílias portuguesas enfrentam
um dos mais caros sistemas de ensino superior da UE e da OCDE apesar do
abaixamento das propinas. Donde, é crítica a questão dos apoios à frequência,
tipologia, número de bolsas e critérios de acesso a essas bolsas, para lá da
existência ou não de contingentes ou quotas.
Embora já seja feito em muitas
escolas, sobretudo no final e durante o pós-básico, seria desejável que os
dispositivos de orientação vocacional tivessem os recursos necessários para de
forma alargada providenciarem informação clara sobre a natureza da oferta
formativa, das suas características e solicitações, a que áreas de desempenho
permitem aceder no mundo profissional, etc. Por outro lado, esse apoio também
envolve o trabalho com os alunos no sentido de ajudar a um processo de tomada
de decisão que seja base para procurar qualificação, de natureza diversa, no
ensino superior.
Já no ensino superior e para
todos os alunos é importante que existam dispositivos de apoio institucionais e
também formas de mentoria desenvolvidas já por alunos a frequentar os
estabelecimentos que contribuam para melhores e mais rápidos processos de adaptação
a novas rotinas, métodos de trabalho, dificuldades de adaptação, etc. O nível
de desistência da frequência é alto e mais alto nas populações mais
vulneráveis.
Uma nota final para o óbvio, as
mudanças mais estruturais requerem investimentos e os recursos são finitos,
nenhuma dúvida. No entanto, as políticas públicas exigem opções e, também por
isso, são avaliadas.
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