Uma das questões que com alguma frequência me dá que pensar é a constatação de que, com excepções evidentemente, boa parte dos discursos que produzimos sobre crianças e adolescentes são muitas vezes formulados pela negativa, ou seja, referem-se quase sempre a dificuldades ou características percebidas com negativas e menos vezes com conteúdos positivos.
Este comportamento observa-se
tanto em pais como em professores, sobrevalorizamos o que nos parece de menos
bom e não referimos como seria desejável o que de positivo observamos nos mais
novos.
É verdade que entre adultos
tendemos a funcionar da mesma forma, recordo o enunciado de Marguerite
Yourcenar no imperdível Memórias de Adriano, "O nosso grande erro é querer
encontrar em cada um, em especial, as virtudes que ele não tem e desinteressarmo-nos
de cultivar as que ele possui." Dito de outra maneira, o nosso olhar
direcciona-se sobretudo para o que de menos bom aos nossos olhos os outros
parecem ter, olhamos para o seu avesso e não para o seu direito, por assim
dizer.
Voltando às crianças,
adolescentes e jovens, isto traduz-se no recurso a uma adjectivação e
apreciação muitas vezes negativas sobre eles, "não sabem", "não
se interessam", são "distraídos" ou desatentos,
"desajeitados", "teimosos", "mal educados",
"mal comportados", "ignorantes", etc.
Como é evidente, esta minha
conversa não significa um entendimento idealizado e ingénuo sobre os mais
novos, apenas significa que, como toda a gente, têm direito e avesso, a minha
questão é porque tendemos a ver apenas o avesso.
Tenho ainda a convicção de que
qualquer de nós, pequeno ou grande, só aprende a partir do que sabe, só é mais
pessoa a partir da pessoa que já é, só cresce a partir do que já cresceu, só
faz mais e melhor a partir do que já fez e não a partir do que não aprendeu, não sabe, não é ou não faz.
Conversa de velho, já se vê.
1 comentário:
Tem muita razão no que diz. E é sem dúvida uma grande falha das escolas e de muitos professores.
Acho que é uma coisa tipicamente portuguesa. Sei que nas escolas inglesas é precisamente o contrário
Enviar um comentário