Retomo uma matéria que
frequentemente aqui abordo, a situação de crianças e jovens em risco. Faço-o a
propósito de uma situação que sendo restrita e localizada, pode ser um exemplo
do muito que está por fazer, apesar, naturalmente, de progressos realizados.
Foi instalado em Mirandela um
Centro de Acolhimento Temporário para crianças e jovens com circunstâncias de
vida em risco grave de natureza diferenciada onde aguardam o desenvolvimentos
dos processos de regulação e as decisões dos tribunais.
O objectivo seria de que a
permanência no Centro não ultrapassasse os seis meses mas acontece que a
maioria das crianças e jovens acolhidas estão há mais de seis anos, uma situação
verdadeiramente inaceitável e com consequências óbvias.
De há muito e a propósito de várias questões, que
afirmo que em Portugal, apesar de existirem vários dispositivos de apoio e
protecção às crianças e jovens e de existir legislação no mesmo sentido, sempre
assente no incontornável “supremo interesse da criança", não existe o que
me parece mais importante, uma cultura sólida de protecção das crianças e
jovens de que temos exemplos com regularidade. Poderíamos citar a insuficiência
e falta de formação de juízes que se verifica nos tribunais de Família com
enorme morosidade na resolução de situações de regulação para além surgirem frequentemente
decisões incompreensíveis decisões em casos de regulação do poder parental ou o
silêncio face a situações conhecidas, etc.
Por outro lado, as condições de funcionamento as
Comissões de Protecção de Crianças e Jovens que procuram fazer um trabalho
eficaz estão longe de ser as mais eficazes e operam em circunstâncias difíceis.
Na sua grande maioria as Comissões têm responsabilidades sobre um número de
situações de risco ou comprovadas que transcendem a sua capacidade de resposta.
A parte mais operacional das Comissões, a designada Comissão restrita, tem
muitos técnicos a tempo parcial. Tal dificuldade repercute-se, como é óbvio, na
eficácia e qualidade do trabalho desenvolvido, independentemente do esforço e
empenho dos profissionais que as integram. Esperemos que a decisão hoje
comunicada produza efeitos.
Este cenário permite que ocorram situações,
frequentemente com contornos dramáticos, envolvendo crianças e jovens que,
sendo conhecida a sua condição de vulnerabilidade não tinham, ou não tiveram, o
apoio e os procedimentos necessários. Ainda acontece que depois de alguns
episódios mais graves se oiça uma expressão que me deixa particularmente
incomodado, a criança estava “sinalizada” ou “referenciada” o que foi
insuficiente para a adequada intervenção. Em Portugal sinalizamos e
referenciamos com relativa facilidade, a grande dificuldade é minimizar ou
resolver os problemas referenciados ou sinalizados.
Por isso, sendo importante registar a menor
tolerância da comunidade aos maus tratos aos miúdos, também será importância
que desenvolva a sua intolerância face à ausência de respostas.
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