domingo, 21 de abril de 2013

A PRODUTIVIDADE DOS MÉDICOS

Depois de concluído um processo tutelado pela Administração Central do Sistema de Saúde, os médicos vão ser objecto de avaliação envolvendo parâmetros como “eficácia, eficiência e qualidade”, e avaliando a actividade assistencial, a produtividade e a atitude profissional.
A avaliação de desempenho, é uma ferramenta imprescindível à promoção da qualidade e eficácia de pessoas e instituições pelo que faz todo o sentido definir um modelo de avaliação também para os médicos. As minhas dúvidas começam quando entre os critérios se enuncia produtividade e "atitude profissional e comunicação" com colegas, superiores, doentes e utentes como foi divulgado no início do processo e parece agora confirmado. Este processo suscita algumas dúvidas em algumas das áreas de intervenção do SNS.
Recordo que em 2012, creio que em Agosto, dois sindicatos representativos da classe médica aceitaram aumentar o número de utentes por cada médico de família a troco de compensações salariais “por desempenho”. A medida, que passaria de uma média de 1550 utentes por clínico para mais de 1900, permitiria, sustentaram os sindicatos, diminuir significativamente o número de cidadãos sem médico de família, muitas centenas de milhar, situação verdadeiramente inaceitável, para mais nos tempos de dificuldades que atravessamos.
Apesar disto sabe-se as listas de espera mantêm-se ou aumentam e que existem muitos milhares de pessoas sem médico de família que lutam por uma consulta, sem garantia de a conseguir, indo a meio da noite para a porta do centro de saúde o que coloca uma enorme pressão sobre os actos médicos. Sabe-se que alguns médicos de família são responsáveis por milhares de doentes. Muitas das pessoas que recorrem às consultas são idosas que frequentemente sofrem de “sozinhismo”,a doença de quem vive só, que se minimiza no convívio com outros sós na sala de espera e na atenção de um médico que escuta, por vezes, mais a dor da alma que as dores do corpo.
Neste cenário como avaliar "atitude" e "comunicação". Já estive envolvido em circunstâncias, pessoais ou acompanhando familiares, em que o médico claramente estava pressionado pelo tempo que (não) podia dedicar, a atitude que (não) podia demonstrar, a comunicação que (não) podia estabelecer. As muitas pessoas com horas de espera na sala inibem-no na "atitude e comunicação" e pressionam-no na "produtividade".
Temo que o aumento de utentes por médico e a pressão acrescida sobre os profissionais, com as implicações decorrentes da sua “produtividade” e “desempenho” apesar de assentarem num correcto princípio de avaliação profissional possam, paradoxalmente, ameaçar a qualidade dos serviços prestados.
Ainda assim, nada que se estranhe num tempo em que os números se sobrepõem às pessoas.

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