O Tribunal Cível do Porto deu provimento à
providência cautelar interposta pelo Movimento Revolução Branca no sentido de
contestar a candidatura de Luís Filipe Menezes à Câmara do Porto depois de três
mandatos cumpridos em Gaia.
Sendo que este processo está longe do fim, retomo
o que disse sobre a decisão no mesmo sentido tomada pelo Tribunal Cível de
Lisboa sobre a candidatura de Fernando Seara e a decisão em sentido contrário
do Tribunal Judicial de Tavira relativa à candidatura de José Estevens à
autarquia desta cidade tendo já cumprido três mandatos noutra autarquia.
Gostava que os sinais positivos nos deixassem
pensar que algo pode mesmo mudar para melhor na qualidade da nossa vida cívica
e na saúde da nossa democracia. Nas mais das vezes o entusiasmo esfuma-se
depressa pois a partidocracia tem vindo a arquitectar um sistema altamente
resistente à mudança e protector dos seus interesses.
As decisões impeditivas das candidaturas
radicando na legislação parecem-me, talvez por não ser jurista, as mais óbvias
das decisões e um indicador importante para os preparativos em curso na dança
das cadeiras e que produzem o deprimente espectáculo a que vamos assistindo na
tentativa de promover e dar cobertura às migrações de "dinossauros"
autarcas que assim se eternizam ao serviço da partidocracia.
A lei de limitação de mandatos parece clara na
sua intenção e formulação mas, como sempre, se não serve os interesses
partidários de ocasião, torce-se a lei, é simples, e ela passa a dizer o que
nós queremos que ela diga. O último episódio, de uma mestria insuperável, foi a
"descoberta" feita em Belém de que se trocaram os "da"
pelos "de" entre a lei aprovada na AR e a publicada no DR e, claro,
avoluma-se o alarido.
Não sou jurista, nem constitucionalista e como
cidadão parecem-me razoavelmente claras duas ideias, a saber, em primeiro lugar
é saudável e desejável do ponto de vista, político, democrático e ético que se
limitem os mandatos de cargos políticos exercidos pelo mesmo cidadão, ponto. Em
segundo lugar, a Constituição estabelece o mesmo entendimento político no
artigo 118º, "Princípio da Renovação" afirmando, "Ninguém pode
exercer a título vitalício qualquer cargo político de âmbito nacional, regional
ou local", ponto.
Parece-me, pois, claro que qualquer lei que
cumpra a Constituição, como não pode deixar de ser, não pode aceitar e admitir
que um cidadão, desde que vá saltando de município em município, possa ocupar a
função de presidente de câmara, por exemplo, a título vitalício.
É este entendimento manhoso, inconstitucional,
que a maioria dos partidos representados na Assembleia da República assume na
defesa dos seus interesses locais onde impera amiguismo, aparelhismo e
pagamento de favores e natureza variada. No entanto, deve sublinhar-se que
mesmo dentro dos partidos que enquanto tal "torcem" a lei,
interpretando-a no restrito sentido dos seus interesses, existe muita gente que
sustenta o óbvio, autarcas com três mandatos cumpridos não podem candidatar-se.
No entanto, em termos de saúde ética da nossa
vida cívica, o preço deste pântano é altíssimo. O despudor e a partidocracia
capturaram e debilitaram a qualidade da democracia, a confiança e o
envolvimento cívico dos cidadãos.
Este é, também, uma dimensão enorme da crise, das
crises. Esperemos que estas decisões do Tribunal Cível de Lisboa e do Tribunal
Cível do Porto sejam mesmo um sinal de que algo pode mudar. A decisão do
Tribunal de Tavira foi no sentido de que esta matéria deveria ser decidida
judicialmente quando do processo formal de candidatura por isso também não é
uma situação fechada.
Como diz o Velho Marrafa lá no Meu Alentejo,
"Deixe lá ver". Até porque ainda falta esgotar os recursos,
é claro.
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