A decisão de congelamento de despesa no universo
da administração pública, mais uma vez a eito e sem diferenciações, alarmou os
responsáveis pelas estruturas do Serviço Nacional de Saúde pelo impacto que tal
congelamento poderá ter na qualidade dos serviços prestados designadamente nos
centros de saúde, a resposta de primeira linha para a generalidade das pessoas.
Creio que este cenário por mais que nos incomode e
preocupe, não consegue surpreender-nos. A área da saúde, tal como educação e segurança social, foi sempre identificada
como uma das áreas a sofrer mais cortes e ajustamentos no âmbito da chamada
reforma do estado, ou seja, nos cortes a realizar nas funções sociais. E como
consequência da decisão dos malandros dos juízes do Tribunal Constitucional surgem mais
constrangimentos no SNS e seguramente no âmbito das escolas e da segurança social.
O universo da saúde em Portugal é algo que
solicita uma abordagem diferenciada, também em matéria orçamental, embora seja,
obviamente, necessário minimizar custos, combater desperdícios e ineficácia e
potenciar recursos, nenhuma dúvida sobre isso.
A preocupação com a doença, sobretudo numa
população envelhecida, está permanentemente na cabeça das pessoas e,
naturalmente, não estou a falar de hipocondria. Se a este peso acrescer o facto
de que muitas não têm um médico de família acessível, que conheçam, que as
conheça e com quem, desejavelmente, mantêm uma relação de confiança as pessoas
sentem-se fortemente vulneráveis e impotentes. Acresce que muitas destas
pessoas não terão grandes possibilidades de recurso a serviços privados.
Ainda não há muito tempo o Director da Escola Nacional
de Saúde Pública referia o risco de se verificarem situações de ausência de
consulta ou tratamento por falta de condições financeiras, quer no que respeita
aos serviços, quer por dificuldades das próprias pessoas. A realidade que vamos
conhecendo ilustra isso mesmo, de forma dramática.
Em segundo lugar, quando tanto se fala no estado
social, nos limites desse estado, na privatização de serviços, por exemplo na
saúde, é fundamental perceber e entender que a comunidade tem sempre a
responsabilidade ética de garantir a acessibilidade de toda a gente aos
cuidados básicos de saúde. Os tempos que atravessamos criando obstáculos ao
acesso aos serviços de saúde a que se acrescentam as dificuldades criadas aos
próprios serviços no sentido garantirem o cumprimento da sua missão são
ameaçadores dos padrões mínimos de bem estar e qualidade da assistência em
matéria de saúde.
Como afirma Michael Marmot, que há meses esteve
em Portugal, todas as políticas podem, ou devem, ser avaliadas pelos seus
impactos na saúde.
Talvez a ideia do "custe o que custar"
seja de repensar, pela nossa saúde.
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