sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

O SISTEMA PÚBLICO DE EDUCAÇÃO EM RISCO DE IMPLOSÃO

O Ministro Crato enganou-se no tiro. Tinha ameaçado fazer implodir o Ministério mas parece no bom caminho para fazer implodir a escola, estou a referir-me ao sistema público de educação. A um discurso mascarado com as mágicas palavras de rigor, exigência e qualidade que seduzia enquanto opinador bem acolhido por um sistema e uma opinião pública e publicada a viverem o período de Maria Lourdes Rodrigues e Isabel Alçada, tem-se seguido a definição de uma política educativa que, em aspectos essenciais, se afigura uma ameaça ao direito constitucional de uma educação de qualidade para TODOS os indivíduos em idade escolar.
Sabemos e compreendemos a necessidade de combater o desperdício e conter gastos. Não compreendo nem aceito que medidas como os mega-agrupamentos, o aumento de alunos por turma, as mudanças curriculares que parecem, acho que são, desenhadas para poupar horas docentes, a unidade de gestão do ensino, contribuam para a qualidade do sistema que o Ministro Crato vê certificada por exames, exames, exames e mais exames que se constituem como um crivo que irá expelindo todos os miúdos que nele caiam e que acabarão num qualquer campo de "trabalhos manuais".
Eu sei, já o disse muitas vezes, entendo que as necessidades de docentes do sistema educativo é uma questão complexa e com múltiplas variáveis. Para além dos dramas pessoais de pessoas que com 10 ou 15 anos de serviço, sempre como contratados, a responder a necessidades das escola ficam na contingência de perder o trabalho ou de professores do quadro que ficarão com essa coisa chamada "horário zero" quando estão em escolas em que a população discente aumenta em função dos agrupamentos, mas que passam à condição de descartáveis, o processo que se está a seguir parece-me inaceitável e mau, muito mau, para a qualidade da educação. Peço desculpa, não sou professor nesta situação, mas isto é incompreensível, não estamos a falar de uma empresa de serviços ou da indústria que por má gestão ou mudanças no mercado deixa de ser viável. Os miúdos estão lá, as necessidades também mas dispensam-se os professores alargando o trabalho dos outros com o óbvio compromisso da qualidade. Contas de merceeiro, sem ofensa ao meu tio Eugénio, mas de um Ministro da Educação espera-se um pouco mais.
Mais uma vez afirmo a minha ideia. Conhecendo os territórios educativos do nosso país, julgo que faria sentido que os recursos que já estão no sistema, pelo menos esses, incluindo professores contratados com muitos anos de experiência, fossem aproveitados em trabalho de parceria pedagógica, que se permitisse a existência em escolas mais problemáticas de menos alunos por turma ou ainda que se utilizassem em dispositivos de apoio a alunos em dificuldades.
Os estudos e as boas práticas mostram que a presença de dois professores na sala de aula são um excelente contributo para o sucesso na aprendizagem e para a minimização de problemas de comportamento bem como se conhece o efeito do apoio precoce às dificuldades dos alunos.
Sendo exactamente estes os dois problemas que mais afectam os nossos alunos, talvez o investimento resultante da presença de dois docentes ou de mais apoios aos alunos, compense os custos posteriores com o insucesso, as medidas remediativas ou, no fim da linha, a exclusão, com todas as consequências conhecidas.
É só fazer contas. E nisso o Ministro Nuno Crato é especialista. O problema é que os miúdos, os professores, as escolas, na sua enorme diversidade de necessidades e problemas não cabem numa folha de Excel.
Isto, creio e lamento, o Professor Nuno Crato não vai entender nunca.

3 comentários:

Ana disse...

Parabéns pelo seu artigo, imaculado na apreciação.
O que se vive na(s) escola(s), neste mês de Fevereiro, é já uma exaustão própria de Maio ou Junho, de final do ano lectivo portanto, com a agravante de se ir entranhando a suspeita de que o pior ainda está para vir, porque nos têm ensinado que o mau, o destrutivo, o absurdo, afinal existem e têm o inferno como limite.

Zé Morgado disse...

Preferia não ter de escrever o que escrevi.

Ana disse...

Acredito.
Com os meus 49 anos de idade e 28 de serviço (docente), preferia não ter de viver o que escreveu, com a agravante de ter de o fazer mais uns 16 anos... se sobreviver. (já me sinto tão cansada para a carga actual!)