É hoje notícia mais um episódio da narrativa
sobre o que se passa no âmbito das praxes académicas. Desta vez três alunos
foram hospitalizados com excesso de álcool consumido em eventos “praxísticos”
numa instituição de ensino superior politécnico. A Direcção do Instituto
suspendeu até final do ano lectivo as actividades de praxe académica.
Aqui há uns meses, numa decisão pouco habitual, o
Tribunal da Relação do Porto confirmou a condenação decidida pelo Tribunal de
Famalicão da Universidade Lusíada a indemnizar a família de um aluno que
faleceu no âmbito de um episódio de praxe académica. A questão das praxes
académicas tem sido um tema recorrente neste espaço, mas creio que se justifica
sempre a sua abordagem dados os episódios que vão acontecendo. Este ano, já não
é inédito, como estão lembrados tivemos em Beja uma ocorrência também com
contornos muito graves no contexto das praxes académicas. Sabemos todos que de
há alguns anos para cá estas situações são comuns bem como são comuns
comportamentos de outra natureza mas, do meu ponto vista, igualmente violentos.
Recordo que há meses, as estruturas estudantis
ligadas às praxes de nove universidades e institutos acordaram na elaboração de
um documento comum que estabeleça um conjunto de princípios que permita regular
os comportamentos de praxe e tentar pôr fim aos abusos que regularmente têm
vindo a acontecer, alguns com consequências particularmente graves que, aliás,
já motivaram a tomada de posições proibitivas por parte de algumas reitorias e
direcções de escola. Esta iniciativa revela por parte dos próprios estudantes a
aceitação de situações que devem ser evitadas, daí o esforço de regulação pois
os códigos já existentes não parecem ser suficientes para assegurar o
equilíbrio desejável.
Como várias vezes já aqui afirmei partindo de um
conhecimento razoavelmente próximo deste universo, a regulação dos
comportamento nas praxes parece-me absolutamente indispensável. Parece-me ainda
importante que este movimento de regulação integre o respeito por posições
diferentes por parte dos estudantes sem que daí advenham consequências
implícitas ou explícitas. Estamos a falar de gente crescida e, espera-se,
autodeterminada, seja numa posição favorável ou desfavorável.
Na verdade, de forma aparentemente tranquila
coexistem genuínas intenções de convivialidade, tradição e vida académica com
boçalidade, humilhação e violência sobre o outro, no caso o caloiro. Tenho
assistido a cenas absolutamente deploráveis por mais que os envolvidos lhes
encontrem virtudes.
Apesar dos discursos dos seus defensores,
continuo a não conseguir entender como é que, a título de exemplo, humilhar
rima com integrar, insultar rima com ajudar, boçalidade rima com universidade,
abusar rima com brincar, ofender rima com acolher, violência rima com
inteligência ou coacção rima com tradição. Devo, no entanto sublinhar que não
simpatizo com estratégias de natureza proibicionista, sobretudo em matérias que
claramente envolvem valores. Nesta perspectiva, parece-me um passo positivo a anunciada
iniciativa de regulação que envolverá diferentes academias.
Quando me refiro a esta questão, surgem
naturalmente comentários de pessoas que passaram por experiências de praxe que
não entendem como negativas, antes pelo contrário, afirmam-nas como algo de
positivo na vida universitária. Acredito e obviamente não discuto as
experiências individuais, falo do que assisto.
A minha experiência universitária, dada a época,
as praxes tinham entrado em licença sabática, por assim dizer, foi a de alguém
desintegrado, isolado, descurriculado, dessocializado e taciturno porque não
acedeu ao privilégio e experiência sem igual de ser praxado ou praxar.
Provavelmente, advém daí a minha reserva.
Sem comentários:
Enviar um comentário