Hoje encontra-se um trabalho interessante no
Público sobre uma das questões mais complexas do trabalho escolar, a
indisciplina dos alunos. Nele são abordadas as dificuldades, as práticas, os
efeitos do novo Estatuto do Aluno que visava, afirmava o MEC, restaurar a
autoridade dos professores, estabelecendo a regulação do quadro de sanções e
castigos aos alunos e de multas e suspensão de apoios aos pais de aluno
indisciplinados e absentistas, enfim, um trabalho que merece leitura atenta.
Sobre este universo umas notas breves algumas já por aqui deixadas.
A indisciplina escolar é matéria de competência
da escola e matéria de responsabilidade de toda a comunidade, incluindo os
pais, naturalmente, e todas as figuras com relevância social, por exemplo, não
se riam, políticos ou jogadores de futebol. O Estatuto do Aluno, qualquer um, é
um regulador, melhor ou pior, mas nunca A solução e, pela mesma razão, nunca
será A causa da indisciplina.
As mudanças significativas no quadro de valores e
nos comportamentos criam dimensões novas em torno de um problema velho, a
indisciplina. Daqui decorre, por exemplo, que restaurar a autoridade dos
professores, tal como era percebida há décadas, é uma impossibilidade porque os
tempos mudaram e não voltam para trás.
Um professor ganha tanta mais autoridade quanto
mais competente e apoiado se sentir. Assim, importa reflectir sobre a formação
de professores. As escolas de formação de professores não podem “ensinar” só o
que sabem ensinar, mas o que é necessário ser "aprendido" pelos novos
professores e pelos professores em serviço face a novos problemas e realidades.
Por outro lado, talvez fosse de analisar como o próprio MEC respeita a
autoridade dos professores e os contributos que as políticas educativas de há
anos para cá têm dado para a sua degradação. Insisto, problemas
"novos" carecem também de abordagens "novas" que retomo no
fim do texto.
Quanto às multas aos pais e suspensão de apoios
sociais retomo notas que já aqui deixei.
1 - A maioria dos pais não gosta que os seus
filhos sejam "maus". A maioria não sabe como fazê-los
"bons". Estes precisam de apoio não de multas ou punições. Ponto.
2 - Uma minoria, muito pequena, de pais de miúdos
"maus" são pais maus não estão interessados ou preocupados em ser
bons, nem se preocupam com os filhos, são "negligentes". Nestes
casos, o problema é, no limite, retirar a guarda dos filhos, a multa não mexe
seguramente com a negligência destes pais. Ponto.
3 - Um miúdo "mau" levanta problemas numa
escola, qualquer escola, onde existem umas dezenas largas de especialistas em
educação que sentem a maior dificuldade em "resolver" os problemas
criados por esse miúdo "mau", não conseguindo, com frequência,
resultados positivos. Será que alguém que conheça estes cenários acredita que
os pais serão capazes de os resolver, por si, mesmo se lhes retirarem parte do
abono de família ou de qualquer outra prestação social? Não acredito. Ponto.
Escolas organizadas, com cultura institucional
sólida traduzida na adequação e consistência dos seus projectos educativos e
com lideranças eficazes são mais organizadoras dos comportamentos de quem nelas
habita, como qualquer outra organização. Também por isto se questiona a
incompetente constituição de mega-agrupamentos e de escolas e turmas com
dimensões excessivas.
Parece também importante a existência de
estruturas de mediação entre a escola e a família o que implica a existência de
recursos humanos qualificados e disponíveis. Veja-se o trabalho dos GAAFs
apoiados pelo IAC ou iniciativas que algumas escolas conseguem desenvolver, no
trabalho do jornal é citado o exemplo da Escola Básica e Secundária de
Carcavelos, que permitam apoiar os pais dos miúdos maus que querem ter miúdos
bons e identificar as situações para as quais, a comprovada negligência dos
pais exigirá outras medidas que envolvam, eficazmente e em tempo oportuno as
CPCJ.
Um caminho de autonomia, com a alteração
desejável dos modelos de organização e funcionamento das escolas e na gestão
curricular, deveriam permitir que as escolas, algumas escolas, mais
problemáticas tivessem menos alunos por turma ou ainda que se utilizassem,
existindo, professores em dispositivos de apoio a alunos em dificuldades. Por
outro lado, os estudos e as boas práticas mostram que a presença simultânea de
dois professores é um excelente contributo para o sucesso na aprendizagem e
para a minimização de problemas de comportamento bem como se conhece o efeito
do apoio precoce às dificuldades dos alunos.
As dificuldades dos alunos estão com muita
frequência na base do absentismo e da indisciplina, os alunos com sucesso, em
princípio, não faltam e não apresentam grandes problemas de indisciplina.
Os professores também sabem que na maior parte
das vezes, os alunos indisciplinados não mudam os seus comportamentos por mais
suspensões que sofram. É evidente que importa admitir sanções, no entanto,
fazer assentar o combate à indisciplina nos castigos aos alunos e nas multas e
retirada de apoios aos pais, é ineficaz, é facilitista na medida em que é a
medida mais fácil e mais barata, é demagógica porque vai ao encontro dos
discursos populistas que aplaudem a ideia do "prender" do "expulsar"
até ficarem só os nossos filhos.
O problema é quando também nos toca a nós, aí
clamamos por apoios.
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