quinta-feira, 4 de setembro de 2014

A LER, "A PERVERSÃO DA LIBERDADE"

"A perversão da liberdade"

Paulo Guinote desenvolve no Público uma abordagem a um aspecto central das políticas educativas que merece reflexão.
De há uns anos para cá têm-se ouvido insistentemente discursos assentes numa visão “mágica” da chamada liberdade de educação que se caracterizam frequentemente por demagogia e referências a uma qualidade que as experiências e os estudos conhecidos em muitas realidades não autorizam.
Por outro lado, temos vindo a percorrer um processo fortíssimo de encerramento de escolas, que em algumas circunstância poderia ser defensável, mas em que muitas outras ocorre com evidente prejuízo das crianças e das famílias obedecendo a interesses outros que não a qualidade da educação. A questão económica também não pode justificar todas as decisões pois o investimento em educação de qualidade é de retorno garantido.
Na perspectiva de Paulo Guinote uma das consequências deste processo é justamente, um ataque à liberdade de educação num sentido mais sólido, a escolha que possa não estar só dependente do poder de compra.
Na verdade, fechando escolas, centralizando respostas com lotação elevada, as famílias terão menos possibilidade de aceder a escolas integradas no sistema público de ensino e educação.
A questão é que este movimento se inscreve na visão e missão a que Nuno Crato deitou mãos. De facto, nos seus tempos de opinador eram muito conhecidas as suas teses contra o construtivismo e contra o eduquês, seja lá isso o que for.
Ao chegar a Ministro e de uma forma cada vez mais clara, Nuno Crato reciclou o seu discurso, convertendo-se ao politiquês, negação da realidade, discursos demagógicos cheios de referências que vendem bem, rigor, excelência, avaliação, por exemplo, e, mais do que isso, assumiu uma visão não construtivista mas destrutivista. Assim, empreendeu a destruição tranquila do sistema público de ensino e educação, cortes nos professores, encerramento de escolas, incremento dos dispositivos de selecção, desvalorização dos professores, etc.
Neste contexto, e de acordo com a agenda, promove-se a procura das respostas educativas fora do sistema público, ou seja, algumas famílias poderão aceder aos melhores serviços, até com apoio estatal, dado diretamente às famílias ou disponibilizado aos estabelecimentos de ensino.
Como também é sabido, a cultura mais generalizada entende os estabelecimentos de ensino privado como exclusivos e muitos deles são profundamente selectivos na população que acolhem, o que leva, justamente, muitos pais  a escolher "comprar", por assim dizer, essa exclusividade, que só por existir já é um negócio, um bom negócio.
O problema grave e inquietante é que a maioria das famílias irá, evidentemente, manter os seus filhos nas escolas públicas que sofrendo forte desinvestimento terão menos recursos, apoios e autonomia e em que os professores serão obrigados a funcionar num registo de "contents delivery" a turmas enormes de alunos que através de sucessivos exames passarão por uma espécie de "darwinismo educativo" sobrevivendo os clientes mais fortes, sendo os mais fracos enviados para o "trabalho manual".
Sopram ventos adversos, são os mercados a funcionar, dizem, também na educação. Os clientes mais "favorecidos", para utilizar um eufemismo frequente, comprarão bons serviços educativos e os menos "favorecidos" ... assim continuarão.
Sem liberdade de educação, como refere Paulo Guinote.
É o destino.

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