Amanhã as aulas começam "a sério". Com
a competente ajuda do MEC não começarão para todas as crianças nem para todos
os professores. Os responsáveis(?) refirmam que é normal, num estranho
entendimento do que significa normalidade. Algumas notas a pensar, sobretudo, nos que vão iniciar a escolaridade obrigatória.
Para a maioria das crianças e apesar da sua experiência
na educação pré-escolar, a "entrada" na escola, ou melhor, o processo
de início da escolaridade obrigatória, continua a ser uma experiência fundamental
para o lançamento de um percurso educativo com sucesso.
Em muitíssimas circunstâncias da nossa vida,
quando alguma coisa não correu bem, é possível recomeçar e tentar de novo esperando
ser melhor sucedido. Todos nós experimentámos episódios deste tipo.
Pois bem, o
processo de início da escolaridade envolve na verdade um conjunto de circunstâncias irreversíveis, ou seja,
quando corre mal já não é possível voltar atrás e recomeçar com a esperança de
que a situação vá correr melhor. Por isso se torna imprescindível que o começo
seja positivo. Para isso, importa que seja pensado e orientado, que crie as
rotinas, a adaptação e a confiança em miúdos e em pais indispensáveis à
aprendizagem e ao desenvolvimento bem sucedidos.
É fundamental não esquecer que os miúdos à "entrada"
na escola não estão todos nas mesmas condições, pelas mais variadas razões,
ambiente e experiências familiares, percurso anterior, características
individuais, etc. o que exige desde o início uma atenção diferenciada que
combata a cultura de que devem ser todos tratados da mesma maneira,
normalizando o diferente, que alguma opinião publicada e ignorante defende.
Antes de, com voluntarismo e empenho, se tentar
ensinar aos miúdos as coisas da escola é preciso, como sempre afirmo, dar
tempo, oportunidade e espaço para que os miúdos aprendam a escola. Depois de
aprenderem a escola estarão mais disponíveis para aprender então as coisas da
escola.
Vai começar o tempo do trabalho "a
sério" e muitas crianças irão rapidamente sentir-se pressionados para a
excelência, o mundo não é para gente sem sucesso. Vão ter que adquirir
competências, muitas competências, em variadíssimas áreas, porque é preciso ser
bom em tudo e é preciso preparar para o futuro, curiosamente, descuidando, por
vezes, o presente.
E vão também começar a perceber como anda confusa
a cabeça dos adultos, como estamos sem perceber o nosso próprio presente e com
dificuldade em antecipar o futuro, que será o presente deles.
Vão, parte deles, desaprender de rir, de se
sentir bem e de brincar, a coisa mais séria que sempre fizeram.
Vão ouvir cada vez mais frequentemente qualquer
coisa como "não podes fazer isso, já és uma mulherzinha, ou um homenzinho",
como se as mulherzinhas e os homenzinhos já crescidos não fizessem asneiras.
Vão conhecer tempos em que se sentem sós e
perdidos com um mundo demasiado grande pela frente.
Mais cedo ou mais tarde, alguns deles, vão sentir
uma dor branda que faz parte do crescer mas que, às vezes, não passa com o
crescer.
Também sei, felizmente que a grande maioria vai
continuar a sentir-se bem, por dentro e para fora.
Pode parecer-vos um pouco estranho, mas gostava
que a estes miúdos que agora vão começar "a escola", tal como aos
outros que já a cumprem, lhes apetecesse "fugir para a escola" e que
nós possamos ser capazes de lhes dizer "Cresçam devagarinho, não tenham
pressa".
É que depressa e bem, não há quem, como se
costuma dizer.
Boa sorte para alunos, professores e pais.
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