terça-feira, 16 de setembro de 2014

(IN)DIFERENÇA

Primeiro esqueceram que muitas crianças precisam de apoios especiais para crescer e aprender.
Não era importante, os nossos filhos aprendem e crescem muito bem.
Em seguida esqueceram que todas as crianças que têm algumas dificuldades podem precisar de ajuda.
Não era importante, os nossos filhos não têm dificuldades.
Depois esqueceram que algumas crianças podem precisar de ajudas especiais para poder realizar exames.
Não era importante, os nossos filhos realizam os exames sem problemas.
Logo a seguir esqueceram que todas as crianças devem ir à escola, é um bem de primeira necessidade.
Não era importante, os nossos filhos vão à escola, para qualquer escola.
Em seguida esqueceram que juntar continuadamente maus alunos com outros maus alunos não os torna melhores alunos.
Não era importante, os nossos filhos são bons alunos.
Depois esqueceram que a esmagadora maioria dos pais com filhos que não se comportam bem, precisa de apoio e ajuda, não de multas.
Não era importante, os nossos filhos portam-se bem.
Depois esqueceram-se que os miúdos crescem e aprendem melhor no meio de um grupo que no meio de uma multidão que os torna anónimos e transparentes.
Não era importante, os nossos filhos crescem e aprendem num grupo sendo bem visíveis.
Em seguida esqueceram que sendo a escola um bem de primeira necessidade, é fundamental para todos, tem que se preocupar com todos e não só com alguns.
Não era importante, os nossos filhos estão incluídos nos alguns.
Finalmente esqueceram as crianças.
Agora, que percebi, talvez seja tarde para a escola pública.
Ou não.  

Escrito em 5/6/2012 a partir da Indiferença de Brecht 

PS - O que está a acontecer neste início de ano lectivo e os relatos que vou conhecendo de múltiplas escolas deixam-me particularmente descrente no entendimento sério de que o direito a uma educação de qualidade para todos os alunos não seja de geometria variável ao sabor da conjuntura económica ou dependente da agenda ideológica dos ocupantes de circunstância da 5 de Outubro.

Amanhã passa e continua a luta.

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