Um dia destes na papelaria do Bairro assisti a um diálogo de que procuro reproduzir o mais fielmente possível o essencial.
Bom dia, queria encomendar os
livros para a escola.
Sim senhora, é desta escola aqui?
Sim.
De que ano?
Do 8º.
Vou tomar nota. Quer os livros
todos?
Sim, parece que são precisos
todos, é muito dinheiro. Mas não quero os CDs.
Não quer os CDs?
Não, não servem para nada, só
para gastar dinheiro. O ano passado comprei os CDs e a minha filha disse que
não foram usados. Este ano não os compro.
...
Nesta altura está decorrer este
período de "encomenda" dos manuais e os pais sentem o peso temendo
que representam.
Continuo a pensar que esta
questão merecia ser repensada como várias vezes tenho referido. Do meu ponto de
vista, verifica-se um excesso de "manualização", do trabalho dos
alunos, potenciado com o aumento do número de alunos por turma e o que tem
óbvias implicações didáctico-pedagógicas e, naturalmente, económicas pelo peso
nos orçamentos familiares.
Apesar da progressiva
disponibilização de outras fontes de informação e do acréscimo de
acessibilidade através das tecnologias de informação e de outros suportes, a
utilização dessas fontes alternativas aos manuais é baixa e pouco valorizada
por pais e alunos. De facto, embora o abandono do “livro único” tenha ocorrido
há já bastante tempo e de uma preocupação, ainda pouco eficaz, com a qualidade
dos manuais, predomina a sua utilização e dos materiais de apoios que lhes vem
associado, cadernos de exercícios e fichas, cadernos de actividades, materiais
de exploração, CDs, etc. etc. que submergem os alunos e oneram as bolsas
familiares, até porque muitos destes materiais não são incluídos nos apoios
sociais escolares.
Em muitas salas de aula, dada a
natureza da estrutura e conteúdos curriculares e do estabelecimento de forma
desastrada das metas curriculares, corre-se o risco de substituir a
“ensinagem”, o acto de ensinar, pela “manualização”ou “cadernização” do
trabalho dos alunos, ou seja, a acção do professor será, sobretudo, orientar o
preenchimento dos diferentes dispositivos que os alunos carregam nas mochilas.
Do meu ponto de vista, a
minimização da dependência dos manuais passaria, entre outros aspectos, por uma
reorganização curricular, diminuindo a extensão de algumas conteúdos, por
exemplo, o que permitiria a alunos e professores um trabalho de pesquisa e
construção de conhecimentos com base noutras fontes potenciando, por exemplo, a
acessibilidade que as novas tecnologias oferecem.
É importante caminharmos no
sentido de atenuar a fórmula única instalada, o professor ensina com base no
manual o que o aluno aprende através do manual que o pai acha muito importante
porque tem tudo o que professor ensina.
Como já tenho afirmado, penso que
seria de considerar a possibilidade dos manuais escolares serem
disponibilizados pelas escolas e devolvidos pelos alunos no final do ano
lectivo ou da sua utilização, ficando as famílias com "folga" para
aquisição de outros materiais, livros por exemplo, sendo penalizadas pelo seu
eventual dano ou extravio. Como é evidente, dentro desta perspectiva, a própria
concepção dos manuais deveria ser repensada no sentido de permitir a sua
reutilização.
Não esqueço, no entanto, o peso
económico deste mercado e como são os mercados que mandam ...
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