"Querem pôr portugueses a ter mais bebés? Arranjem-lhes um emprego"
A situação portuguesa no que
respeita aos nascimentos e renovação geracional é de tal forma preocupante que
qualquer iniciativa que possa contribuir para minimizar a queda de nascimentos
ou, melhor, reverter esta tendência como já alguns países europeus,
conseguiram, casos da França e Irlanda, é de registar.
No entanto, temo que do conjunto
de medidas agora propostas pelo Primeiro-ministro com o objectivo de "remoção
dos obstáculos à natalidade", acabem por se tornar algumas bem intencionadas
ideias, pouco dirigidas à questão central e avulsas ou inexequíveis pois são
contraditórias com as políticas que o Governo tem levado a cabo.
Como aqui escrevia há dias, Portugal
integra o grupo com menores apoios sociais para que os pais fiquem mais tempo
em casa com filhos pequenos sendo que sobretudo nas zonas mais urbanas, (o
interior desertifica-se o que também contribui para a baixa natalidade), a
oferta de estruturas formais de acolhimento de bebés crianças é insuficiente
sendo que temos um dos mais elevados custos de equipamentos e serviços para
crianças.
Vivemos com uma taxa de
desemprego que, oficialmente, ronda agora os 15% mas que sabemos atingir
bastante mais gente. Muitas destas pessoas são sobretudo jovens ou mais idosos,
o que, por razões diferentes, uns não podem assumir o encargo com filhos, os
outros porque não têm recursos para ajudar os seus filhos, torna difícil a
promoção da natalidade e as medidas anunciadas não parecem eficazes.
Importa ainda não esquecer a
discriminação salarial de que muitas mulheres, sobretudo em áreas de menor
qualificação, são ainda alvo e a forma como a legislação laboral e a sua
“flexibilização” as deixam mais desprotegidas. São conhecidas muitas histórias
sobre casos de entrevistas de selecção em que se inquirirem as mulheres sobre a
intenção de ter filhos, sobre casos de implicações laborais negativas por
gravidez e maternidade, sobre situações em que as mulheres são pressionadas
para não usarem a licença de maternidade até ao limite, etc. Foi recentemente
noticiado que algumas empresas exigem às mulheres um compromisso de que não
irão engravidar nos próximos 5 anos. Não adianta argumentar com o quadro legal
existente ou que venha a existir. Em Portugal a lei tem mais um carácter indicativo
que imperativo.
Em tempos altamente competitivos
com a proletarização do trabalho com cortes sucessivos nos salários e nas
prestações sociais, as pessoas hipotecam os projectos de vida em troca das
migalhas que permitam a sobrevivência o que lhes retira margem negocial ou
liberdade de escolha.
A fiscalização e regulação são
insuficientes, uso e abuso de estágios não remunerados ou miseravelmente pagos
e que não asseguram continuidade, condições de trabalho degradantes cuja não
aceitação implica a perda do lugar em troca por alguém ainda mais necessitado
e, portanto, calado.
A promoção de projectos de vida familiar que incluam filhos implica, necessariamente, intervir nas políticas de emprego e protecção do emprego e da parentalidade, na discriminação e combate eficaz a abusos e a precariedade ilegal, na inversão do trajecto de proletarização com salários que não chegam para
satisfazer as necessidades de uma família com filhos e altos custos nos
serviços educativos apesar de uma escolaridade dita gratuita, por exemplo. A questão é que a política que tem vindo a ser seguida não permite acreditar que existam
alterações.
Por outro lado, é urgente a
acessibilidade real (na distância e nos custos) aos equipamentos e serviços
para a infância com o alargamento da resposta pública de creche e educação
pré-escolar, cuja oferta está abaixo da meta estabelecida.
É uma questão de futuro. Não
chega um conjunto de medidas, algumas positivas, mas que podem permanecer avulsas
e voluntaristas e sem impacto significativo.
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