"Avaliação da FCT definia à partida que metade dos centros de investigação ficaria pelo caminho"
Um trabalho muito interessante no
Público sobre o recente e catastrófico processo de avaliação dos Laboratórios e
Centros de Investigação veio mostrar o que a comunidade científica já sabia,
aliás, mais do que saber, tinha sentido.
A coisa resume-se facilmente. A
Fundação para a Ciência e Tecnologia contratou uma moribunda European Science Foundation para um trabalho sujo,
liquidar parte significativa das estruturas de investigação existentes em
Portugal.
Definiu à partida que metade das
entidades deveriam ser eliminadas logo na primeira fase e a ESF que fizesse o trabalho. Para dar suporte às
decisões recorreu-se de forma absolutamente delirante à tirania dos índices
bibliométricos através da Elsevier e constituíram-se equipas de avaliadores que
sem dar a cara se dispuseram a fazer o trabalho sujo.
O resultado deste tenebroso
processo é conhecido, pode aceder-se a muitos exemplos no blogue Rerum Natura
onde têm sido reportados sucessivos exemplos de avaliações e tomas de posição
de investigadores e estruturas.
Nas avaliações realizadas
verificou-se de tudo, critérios ambíguos e falta de transparência, avaliação de áreas científicas por avaliadores fora dessa área e sem
peso científico, avaliações completamente contraditórias, mal fundamentadas,
sobre o mesmo trabalho, ignorância sobre algumas temáticas em avaliação, desconhecimento
das variáveis contextuais, etc.
O resultado pretendido pela FCT
foi atingido, boa parte do tecido de investigação em Portugal foi, vai ser,
destruído. Muitos Laboratórios e Centros de investigação com resultados impostantes e reconhecidos vêem fortemente comprometido, quando não impossibilitado, o seu trabalho. É uma irresponsabilidade delinquente.
Nada disto quer dizer,
evidentemente, que a investigação não deva ser avaliada e escrutinados os
apoios financeiros. A questão é que esta avaliação deve ser séria e competente,
com critérios claros e por avaliadores reconhecidos e competentes nas áreas que avaliam.
Também sem surpresa e na linha
das apreciações do Ministro Nuno Crato, o Presidente da FCT, Miguel Seabra, vem
dizer que o processo foi competente e adequado, promove a excelência, o rigor
... blá, blá, blá. Trata-se do estranho entendimento de normalidade que faz
escola no MEC.
A questão é que este processo
montado para eliminar muitas estruturas terá custos brutais para o Portugal.
Com há dias afirmava o Professor Carlos Fiolhais, esta decisão do Gobverno
"está a matar a árvore do desenvolvimento”.
Na verdade, está estudada e
reconhecida de há muito a associação fortíssima entre
o investimento em educação e investigação e
o desenvolvimento das comunidades, seja por via directa, qualificação
e produção de conhecimento, seja por via indirecta, condições económicas,
qualidade de vida e condições de saúde, por exemplo.
Este processo vai ameaçar, em
muitos casos acaba mesmo os excelentes resultados que muitos
centros, laboratórios e unidades de investigação e as instituições de
ensino superior têm vindo a alcançar e que atestam o esforço e a competência da
comunidade científica portuguesa e o trabalho realizado no âmbito do
ensino superior e investigação, traduzidos no reconhecimento internacional
das nossas instituições.
Como em quase tudo é uma questão
de escolhas e prioridades de quem lidera. O problema como referia também o
Professor Sobrinho Simões num entrevista de há algum tempo sobre estas questões
é que "os nossos políticos têm um problema ... alguns não se apercebem do
valor do ensino superior e da investigação".
A negrura crática que cai sobre a
investigação vai ter consequências brutais em termos
de desenvolvimento científico e económico para além, evidentemente,
do impacto nas carreiras pessoais assim ameaçadas de milhares de pessoas que
investigam, criam conhecimento, promovem desenvolvimento e que, provavelmente,
desistem ou emigram.
E assim se destrói uma
política científica que vinha a produzir resultados positivos.
A história não os absolverá.
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