quinta-feira, 4 de julho de 2013

UM DIA JÁ NÃO AGUENTO

A Associação Portuguesa de Apoio à Vítima vai divulgar hoje os resultados de um estudo sobre a frequência e o conhecimento sobre stalking, cyberstalking, bullying e cyberbullying. Mais de um quarto dos inquiridos afirmam conhecer alguém que já foi vítima de algum destes comportamentos e 5% assume já ter sido vítima. Técnicos da Associação admitem que os resultados podem estar subavaliados pois a maioria dos inquiridos não conhece a designação "stalking", embora conheça os comportamentos envolvidos.
Umas notas sobretudo a propósito do universo que conheço melhor, o dos mais novos, onde prevalecem as diferentes formas de bullying incluindo o cyberbullying e que ocorrem predominantemente em contextos escolares.
São frequentes os relatos na imprensa sobre situações de bullying nas nossas escolas, por vezes com situações de sofrimento particularmente graves levando, no limite, a tragédias como a que afligiu no final do ano passado uma menina canadiana que aos 15 anos deu fim à sua narrativa após três anos de sofrimento intenso vítima de ciberbullying. Tudo começou com uma fotografia ingenuamente colocada nas mãos de alguém que a divulgou e as consequências foram trágicas.
Felizmente que os casos de bullying nas suas diversas formas não terminam todos nesta tragédia, mas são sempre uma tragédia.
Por outro lado, a frequência com que ocorrem estes episódios solicita que lhes dediquemos atenção ajustada, nem sobrevalorizando o que promove insegurança e ansiedade, nem desvalorizando negligenciando riscos e sofrimento.
Neste universo importa considerar dois eixos fundamentais de intervenção por demais conhecidos, a prevenção e a intervenção depois dos problemas ocorrerem. Esta intervenção pode, por sua vez e de forma simplista, assumir uma componente mais de apoio e correcção ou repressão e punição, sendo que podem coexistir.
Com alguma demagogia e ligeireza a propósito do bullying, as vozes a clamar por castigo têm do meu ponto de vista falado mais alto que as vozes que reclamam por dispositivos de prevenção, intervenção e apoio para além da óbvia punição, quando for caso disso.
Relembro que o Portal sobre o bullying teve durante o seu primeiro ano de funcionamento cerca de 650 000 visitas e respondeu a 700 solicitações.
Esta utilização mostra a necessidade de dispositivos de apoio e orientação absolutamente fundamentais para que pais, professores e alunos possam obter informação e apoio. Lamentavelmente, este serviço é exterior às escolas e ilustra a falta de resposta estruturada e global do sistema educativo, para além das insuficiências na formação de técnicos e de professores sobre esta complexa questão, desde logo para o seu reconhecimento. A definição de dispositivos de apoio sediados nas escolas, com recursos qualificados e suficientes é, a par de ajustamentos nos modelos de organização e funcionamento das escolas e de uma séria reestruturação curricular, uma tarefa urgente.
Do meu ponto de vista, o argumento custos não é aceitável porque as consequências de não mudar são incomparavelmente mais caras. Depois das ocorrências torna-se sempre mais fácil dizer qualquer coisa mas é necessário. Muitas crianças e adolescentes evidenciam no seu dia a dia sinais de mal-estar a que, por vezes, não damos atenção, seja em casa, ou na escola, espaço onde passam um tempo enorme. Estes sinais não podem, não devem, ser ignorados ou desvalorizados.
O resultado pode ser trágico. A Amanda, a menina canadiana, descansou da única forma que não podia e não devia.

Sem comentários: