Segundo a imprensa e contrariamente ao contido no Despacho
que "estabelece os princípios orientadores da organização e da gestão dos
currículos dos ensinos básico e secundário”, a possibilidade de redução do
tempo horário semanal que os alunos do 1º ciclo, menos uma hora por dia, entre
horário lectivo e Actividades de Extensão Curricular, o MEC garantiu que as
escolas do 1º ciclo, continuarão a funcionar entre as 9h e as 17h30 no próximo
ano lectivo.
Esta referência ao tempo de permanência dos alunos mais
pequenos nas escolas, para além de mais um exemplo da confusão de orientações e
determinações do MEC, leva-me a retomar algumas notas sobre esta matéria.
O alargamento progressivo do tempo de estadia nas escolas
dos alunos do 1º ciclo (mas não só) procurou responder a um problema importante
das famílias, a guarda das crianças após as actividades lectivas dados os
horários e estilos de vida das famílias.
O caminho escolhido, um programa designado “Escola a Tempo
Inteiro”, como repetidamente tenho afirmado, assentou numa espécie de pecado
original, um enorme equívoco, a confusão entre Escola a tempo inteiro e
Educação a tempo inteiro. Acresce a este programa que, por “antecipação” ou “prolongamento”
previstos num dispositivo designado por “Componente de Apoio à Família”, as
crianças podem ainda chegar mais cedo às escolas, às 8h ou ficar até mais
tarde, às 19 horas.
Na verdade e para além do subaproveitamento do muito que
nesta matéria era já realizado, por exemplo, através de ATL(s) a funcionar no
âmbito de parcerias com as Associações de Pais e de muitas instituições sociais
e que nos últimos temos tem vindo a retomar-se,
criaram-se respostas que por falta de regulação e orientação e recursos
adequados transformaram a escola numa “overdose” asfixiante para muitos miúdos.
Em termos práticos, conheço muitas situações em
que:
- A dificuldade óbvia e esperada de encontrar
recursos humanos com experiência e formação em trabalho não curricular com
crianças dos 6 aos 10. Este obstáculo acaba por resultar na réplica para as
crianças de aulas e actividades pensadas para pré-adolescentes e adolescentes.
O benefício imediato é quase nulo e a consequência a prazo poderá ser a
desmotivação, no mínimo.
- O modelo de organização do trabalho, sendo
desenvolvido por professores ou outros elementos desconhecedores do modelo de
funcionamento do 1º ciclo, mostra-se, com frequência, completamente desajustado.
Como exemplo real, refiro o horário de um grupo de 1º ano (crianças com 6
anos): trabalham com a professora da turma das 9h às 12 e das 13 e 15 às 15 e
15, e todos os dias têm a seguir dois ou três tempos de 45 minutos até às 17 e
30 ou 18.
Verificamos assim que as crianças estão
envolvidas em tarefas de natureza escolar durante um tempo que nestas idades se
torna completamente excessivo e contraproducente.
Quero sublinhar que o que me parece errado não é
o tempo em que as crianças se envolvem em trabalho e que estão na escola, mas
sim a natureza desse trabalho, "disciplinarizado", ou seja,
organizado por tempos, de forma rígida e ocupado com conteúdos e tarefas não
compatíveis com crianças deste escalão etário.
Este quadro ilustra, creio, o equívoco a que me
referi. Em vez de tentarmos estruturar um espaço que seja educativo a tempo
inteiro, preenchido na escola ou em espaços e equipamentos da comunidade, com
qualidade, assistimos à definição de uma pesada agenda de actividades que está
a motivar situações de relação turbulenta e reactiva com a escola. Alguns pais
têm optado por retirar (quando e se podem) os seus filhos deste tipo de
actividades.
A possibilidade de optarem por ATLs que tem vindo
a retomar-se parece-me de sublinhar, importando, evidentemente, não esquecer
dispositivos de regulação da qualidade do trabalho realizado, sendo mais importante o que se realiza do que o tempo da estadia que provavelmente decorre dos custos económicos de a manter e, naturalmente, das necessidades e recursos das famílias.
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