O artigo do Professor Filinto Lima de hoje no Público em que faz um balanço da política educativa nos últimos
leva-me a umas notas no mesmo sentido mas mais direccionadas para o tempo de
Nuno Crato. Não esqueço, no entanto, que alguns aspectos da política que desenvolveu já vinham em marcha.
Uma pequena referência
introdutória para referir que a entrada de Nuno Crato foi, por assim dizer, em estado
de graça, e entusiasmou muita gente, incluindo algumas figuras mais conhecidas que posteriormente se tornaram bastante críticas.
Tenho para mim, fui falando sobre
isso ao longo destes anos, que a visão de Nuno Crato sobre a educação era
conhecida e, por isso, não são surpreendentes as suas políticas. Creio, aliás,
que boa parte das apreciações positivas que lhe eram feitas decorriam mais da
sua reacção e da reacção de muita gente às políticas desenvolvidas na altura, designadamente
no período da perturbadora passagem de Maria de Lourdes Rodrigues pela 5 de
Outubro, do que da percepção mais profunda do que verdadeiramente Nuno Crato
defendia. Ficou para a história a célebre afirmação sobre a implosão do
Ministério.
Os resultados estão à vista.
O tempo, designadamente, os
tempos mais recentes "apenas" mostram os aspectos operacionais da sua
visão sobre educação e uma enorme incompetência na gestão de processos onde era
suposto não falhar que erguia como bandeiras a excelência, o rigor e a
competência.
Vejamos alguns aspectos mais
particulares.
A transformação dos exames como a
poção mágica para a qualidade, a obsessão com a medida, que transformou a vida
de alunos e professores num processo de contínuo de treino para exames,
hipervalorizando resultados em detrimento de processos e promovendo exclusão.
Aliás, os resultados nos exames estão em processo de abaixamento apesar da “gestão
política” do seu grau de dificuldade, tentação de sempre.
Uma revisão curricular cujas
finalidades principal parecem ter sido, diminuir o número de professores,
esbater a imprescindível formação integral dos alunos retirando peso a áreas
como expressões ou mesmo eliminado a formação cívica. Destaca-se ainda a
construção de currículos extensos, prescritivos assentes em centenas de
inoperacionais metas curriculares que apensa se destina a servir um modelo
direccionado para a medida.
Um processo contínuo de desvalorização
dos professores levando a que muitos milhares fossem empurrados para fora do
sistema sem que as alterações demográficas o justifiquem apesar da habilidosa
abordagem que o MEC faz a esta questão. Esta desvalorização culminou com uma
sinistra Prova de Avaliação de Conhecimentos e Capacidades que é um insulto no
modelo que assumiu e inaceitável como forma de avaliação de docentes.
O desenvolvimento de um modelo
importado da Alemanha e que, tal como está montado e em complemento com os
exames, cria um sistema selectivo, darwinista, criando percursos de primeira e
de segunda para os “sem jeito para a escola”, “preguiçosos”, menos dotados ou
outra qualquer condição que lhes não possibilite serem alunos de uma sistema
“normalizado” até ao limite e incapaz de acomodar a diversidade, justamente a
característica mais evidente de qualquer grupo de alunos actual. Uma referência
mais particular ao universo dos alunos com necessidades educativas especiais
que, frequentemente, sentem negado o direito à educação adequada, de qualidade e a serem incluídos de forma participada nas comunidades educativas.
Um desinvestimento contínuo no
financiamento da escola pública e da sua autonomia sendo que os apoios ao
ensino privado vão progredindo e alimentando os negócios da educação à luz de
uma falaciosa “liberdade de escolha”.
A alimentação de um sistema que é
uma “monstruosidade” como lhe chama Filinto Lima, que tece e se alimenta de uma
burocracia centralizadora asfixiante das escolas e do trabalho dos professores.
Este movimento é desenvolvido envolto na retórica da autonomia que não acontece porque, entre várias outras razões a que o controlo político do sistema não é alheio, o MEC não confia nas escolas e nos professores.
Finalmente, uma referência para o
forte desinvestimento no ensino superior e na investigação com um processo
absolutamente escandaloso e despudorado de avaliação dos centros, unidades e
laboratórios da rede de investigação nacional que respondendo à encomenda que
foi feita pela FCT está, espera-se que possa ser revertido, a liquidar uma boa
parte das estruturas de investigação em Portugal designadamente na área das
Ciências Sociais.
Nesta altura e como já escrevi,
emerge uma outra questão, a herança que a actuação de Nuno Crato irá deixar no
sistema educativo português. Qual será? Que fazer com essa herança?
Creio que ainda nos esperam, para
não variar, dias agitados na educação.
Como também já afirmei,
independentemente de quem vier ou do Governo que se siga, não estou particularmente
optimista.
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