quarta-feira, 18 de novembro de 2015

POLÍTICA EDUCATIVA. UMAS NOTAS DE BALANÇO

O artigo do Professor Filinto Lima de hoje no Público em que faz um balanço da política educativa nos últimos leva-me a umas notas no mesmo sentido mas mais direccionadas para o tempo de Nuno Crato. Não esqueço, no entanto, que alguns aspectos da política que desenvolveu já vinham em marcha.
Uma pequena referência introdutória para referir que a entrada de Nuno Crato foi, por assim dizer, em estado de graça, e entusiasmou muita gente, incluindo algumas figuras mais conhecidas que posteriormente se tornaram bastante críticas.
Tenho para mim, fui falando sobre isso ao longo destes anos, que a visão de Nuno Crato sobre a educação era conhecida e, por isso, não são surpreendentes as suas políticas. Creio, aliás, que boa parte das apreciações positivas que lhe eram feitas decorriam mais da sua reacção e da reacção de muita gente às políticas desenvolvidas na altura, designadamente no período da perturbadora passagem de Maria de Lourdes Rodrigues pela 5 de Outubro, do que da percepção mais profunda do que verdadeiramente Nuno Crato defendia. Ficou para a história a célebre afirmação sobre a implosão do Ministério.
Os resultados estão à vista.
O tempo, designadamente, os tempos mais recentes "apenas" mostram os aspectos operacionais da sua visão sobre educação e uma enorme incompetência na gestão de processos onde era suposto não falhar que erguia como bandeiras a excelência, o rigor e a competência.
Vejamos alguns aspectos mais particulares.
A transformação dos exames como a poção mágica para a qualidade, a obsessão com a medida, que transformou a vida de alunos e professores num processo de contínuo de treino para exames, hipervalorizando resultados em detrimento de processos e promovendo exclusão. Aliás, os resultados nos exames estão em processo de abaixamento apesar da “gestão política” do seu grau de dificuldade, tentação de sempre.
Uma revisão curricular cujas finalidades principal parecem ter sido, diminuir o número de professores, esbater a imprescindível formação integral dos alunos retirando peso a áreas como expressões ou mesmo eliminado a formação cívica. Destaca-se ainda a construção de currículos extensos, prescritivos assentes em centenas de inoperacionais metas curriculares que apensa se destina a servir um modelo direccionado para a medida.
Um processo contínuo de desvalorização dos professores levando a que muitos milhares fossem empurrados para fora do sistema sem que as alterações demográficas o justifiquem apesar da habilidosa abordagem que o MEC faz a esta questão. Esta desvalorização culminou com uma sinistra Prova de Avaliação de Conhecimentos e Capacidades que é um insulto no modelo que assumiu e inaceitável como forma de avaliação de docentes.
O desenvolvimento de um modelo importado da Alemanha e que, tal como está montado e em complemento com os exames, cria um sistema selectivo, darwinista, criando percursos de primeira e de segunda para os “sem jeito para a escola”, “preguiçosos”, menos dotados ou outra qualquer condição que lhes não possibilite serem alunos de uma sistema “normalizado” até ao limite e incapaz de acomodar a diversidade, justamente a característica mais evidente de qualquer grupo de alunos actual. Uma referência mais particular ao universo dos alunos com necessidades educativas especiais que, frequentemente, sentem negado o direito à educação adequada, de qualidade e a serem incluídos de forma participada nas comunidades educativas.
Um desinvestimento contínuo no financiamento da escola pública e da sua autonomia sendo que os apoios ao ensino privado vão progredindo e alimentando os negócios da educação à luz de uma falaciosa “liberdade de escolha”.
A alimentação de um sistema que é uma “monstruosidade” como lhe chama Filinto Lima, que tece e se alimenta de uma burocracia centralizadora asfixiante das escolas e do trabalho dos professores. Este movimento é desenvolvido envolto na retórica da autonomia que não acontece porque, entre várias outras razões a que o controlo político do sistema não é alheio, o MEC não confia nas escolas e nos professores.
Finalmente, uma referência para o forte desinvestimento no ensino superior e na investigação com um processo absolutamente escandaloso e despudorado de avaliação dos centros, unidades e laboratórios da rede de investigação nacional que respondendo à encomenda que foi feita pela FCT está, espera-se que possa ser revertido, a liquidar uma boa parte das estruturas de investigação em Portugal designadamente na área das Ciências Sociais.
Nesta altura e como já escrevi, emerge uma outra questão, a herança que a actuação de Nuno Crato irá deixar no sistema educativo português. Qual será? Que fazer com essa herança?
Creio que ainda nos esperam, para não variar, dias agitados na educação.
Como também já afirmei, independentemente de quem vier ou do Governo que se siga, não estou particularmente optimista.

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