terça-feira, 10 de setembro de 2013

O ABSTENCIONISMO

De acordo com o Conselho Permanente da Conferência Episcopal Portuguesa, a abstenção eleitoral pode conduzir-nos a um beco sem saída, pelo que apela à participação nas próximas autárquicas. Na verdade, os níveis de abstenção têm vindo a ser progressivamente elevados e não me parece que a situação se altere significativamente dado o impacto da cultura e praxis próprias da partidocracia instalada.
Gostava de recordar uma sondagem da Universidade Católica realiza há um ano em que 87% dos inquiridos se revelarem desiludidos com a “sendo que 73% afirmavam que outro Governo faria igual ou pior.
Recordo ainda um trabalho também de 2012 “A Qualidade da Democracia em Portugal: a Perspectiva dos Cidadãos" realizado pelo Instituto de Ciências Sociais no qual 56% dos inquiridos entendiam que a democracia é o melhor sistema, 65% se mostravam pouco ou nada satisfeitos com a democracia e de 70,4% entendiam que a crise veio afectar a qualidade da democracia.
Estes dados vão na mesma linha dos dados do Índice da Democracia 2011 do Economist Intelligence Unit, segundo os quais, Portugal passou da situação democracia plena para uma democracia com falhas, o que segundo a análise realizada se deve sobretudo à erosão da soberania associada à crise da zona euro.
Embora me pareça essencial considerar os efeitos que do ponto de vista da soberania assumem as decisões altamente restritivas no âmbito do Programa que nos foi imposto, creio que a soberania já estava sob ameaça pelo actual cenário económico e político. Parece-me no entanto claro, que a degradação da qualidade de vida das pessoas, relembro que a União Europeia alertou para que as medidas de austeridade em Portugal estão aumentar as assimetrias sociais, não pode deixar de influencia a percepção das pessoas sobre a qualidade da democracia.
Por outro lado, creio que a degradação da qualidade da nossa democracia assenta em três questões fundamentais que telegraficamente refiro retomando algumas notas já aqui afirmadas.
Em primeiro lugar, a nossa organização política tem vindo a transformar a democracia política numa partidocracia . A participação cívica e política dos cidadãos depende quase exclusivamente do controlo dos aparelhos partidários embora se comecem a vislumbrar alguns sinais de mudança. Este controlo, assente no quadro legal e na administração dos interesses pessoais, tem vindo a afastar franjas significativas da população da intervenção cívica e política como atestam os crescentes e elevados níveis de abstenção.
Em segundo lugar, existe uma área do nosso funcionamento cujo mau desempenho contribui decisivamente para a degradação da qualidade da vida cívica. Refiro-me à justiça. De um modo geral o sistema de justiça é percebido como moroso, ineficaz, cheio de manhas e alçapões que acabam por beneficiar os mais poderosos e criar um trágico sentimento de impunidade e desconfiança.
O terceiro aspecto prende-se com os efeitos dos modelos de desenvolvimento económico e político que, apesar de enquadrados numa democracia política, comprometem seriamente uma ideia de democracia económica na medida em que produzem exclusão e pobreza que afecta e ameaça muitos portugueses e que actual situação veio expor de forma dramática.
Sintetizando, do meu ponto de vista, para além de questões de soberania, as verdadeiras causas da degradação da qualidade da nossa democracia remetem para os efeitos da partidocracia, do sistema de justiça e das questões decorrentes da pobreza e exclusão.
Neste quadro, a "desilusão" com a democracia parece-me na verdade algo de preocupante, instalando de mansinho um caldo de cultura favorável à emergência de derivas de natureza não democrática de contornos populistas e demagógicos, produtos altamente perigosos e inflamáveis.
Bons motivos para nos inquietarmos.

1 comentário:

não sei quem sou... disse...

No actual quadro político e por tudo aquilo que o Senhor Professor disse e o que ficou por dizer é evidente que a abstenção não resolve. A Abstenção é apelidade de cambada de preguiçosos.
O VOTO EM BRANCO sim, abanava a partidocracia vigente. A legitimidade democrática para os partidocratas governarem ficava ferida de morte. Estou a referir-me concretamente ás legislativas e não ás autáquicas.

VOTO EM BRANCO, SIM!


VIVA!