segunda-feira, 30 de setembro de 2013

MENORES EM RISCO, FUTURO EM RISCO

Foi conhecido o Relatório da actividade das Comissões de Protecção de Crianças e Jovens em Risco relativo ao primeiro semestre. Algumas notas breves sobre alguns dos dados divulgados.
Aumentou o número  de processos novos relativamente ao 1º semestre do ano passado mas mais significativo foi o aumento de situações relativas ao direito à educação, cerca de 22% do total, embora a exposição a comportamentos que ameaçam o bem-estar da criança, violência doméstica, continuem a ser a situação mais frequente.
A tendência de aumento de situações relativas ao absentismo e abandono escolar potenciadas com o alagamento da escolaridade obrigatória para os 12 anos já vem a verificar-se desde 212 pelo que aumentou significativamente o número de casos reportados pelas escolas, 5480 casos no primeiro semestre deste ano, 31,6% dos novos casos sinalizados.
Verificou-se ainda o aumento do número de situações de consumos, álcool e droga, bem como de indisciplina severa.
Merece registo positivo a diminuição de casos envolvendo negligência, abuso sexual, maus-tratos psicológicos, abandono, mendicidade e trabalho infantil.
Em termos globais e como refere o Juiz Armando Leandro, presidente da Comissão Nacional de Protecção das Crianças e Jovens em Risco,  importa ainda considerar que "nem todos os casos chegam às Comissões de Protecção".
Embora não possa ser estabelecida de forma ligeira nenhuma relação de causa as dificuldades severas que muitas famílias atravessam e a insuficiência de apoios sociais não serão alheias a muitas das situações de risco em que crianças e jovens estão envolvidos pois os estudos mostram que crianças e velhos constituem justamente os grupos mais vulneráveis.
De há muito e a propósito de várias questões, que afirmo que em Portugal, apesar de existirem vários dispositivos de apoio e protecção às crianças e jovens e de existir legislação no mesmo sentido, sempre assente no incontornável “supremo interesse da criança", não existe o que me parece mais importante, uma cultura sólida de protecção das crianças e jovens de que temos exemplos com regularidade. Poderíamos citar a insuficiência e falta de formação de juízes que se verifica nos tribunais de Família com enorme morosidade na resolução de situações de regulação para além de surgirem com alguma regularidade decisões incompreensíveis em casos de regulação do poder parental ou o silêncio face a situações conhecidas, etc.
Por outro lado, as condições de funcionamento as Comissões de Protecção de Crianças e Jovens que procuram fazer um trabalho eficaz estão longe de ser as mais eficazes e operam em circunstâncias difíceis. Na sua grande maioria as Comissões têm responsabilidades sobre um número de situações de risco ou comprovadas que transcendem a sua capacidade de resposta. A parte mais operacional das Comissões, a designada Comissão restrita, tem muitos técnicos a tempo parcial. Tal dificuldade repercute-se, como é óbvio, na eficácia e qualidade do trabalho desenvolvido, independentemente do esforço e empenho dos profissionais que as integram.
Este cenário permite que ocorram situações, frequentemente com contornos dramáticos, envolvendo crianças e jovens que, sendo conhecida a sua condição de vulnerabilidade não tinham, ou não tiveram, o apoio e os procedimentos necessários. Ainda acontece que depois de alguns episódios mais graves se oiça uma expressão que me deixa particularmente incomodado, a criança estava “sinalizada” ou “referenciada” o que foi insuficiente para a adequada intervenção. Em Portugal sinalizamos e referenciamos com relativa facilidade, a grande dificuldade é minimizar ou resolver os problemas referenciados ou sinalizados.
Por isso, sendo importante registar uma aparente menor tolerância da comunidade aos maus tratos aos miúdos, também será fundamental que desenvolva a sua intolerância face à ausência de respostas.

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