Hoje a imprensa é notícia. A
leitura de algumas crónicas do Público de hoje, Daniel Sampaio ou Alexandra Lucas Coelho, deixam perceber a existência de um plano de reestruturação decorrente dos milhões de prejuízo que o jornal vem acumulando.
O texto de Alexandra Lucas Coelho
merece leitura e reflexão atentas incluindo pelos detentores e responsáveis do
Público.
A ameaça sobre o Público, um dos
que compro desde o primeiro número inquieta-me, os jornais são um dos alicerces
da democracia e o Público é um dos bons exemplos mesmo quando me faz irritar
mas as relações são assim.
É recorrente, não só em Portugal,
a discussão da questão da sobrevivência da imprensa e, naturalmente, da sua
independência face aos poderes, político e económico, designadamente. Sabemos
das tentativas recorrentes de controlo político da imprensa, como também sabemos
da eventual agenda implícita dos investimentos dos grupos e poderes económicos
na imprensa, veja-se os investimentos angolanos na comunicação social em
Portugal e os desenvolvimentos recentes que envolvem o Sol e o I.
Por outro lado, a evolução do
próprio mundo dos jornais, a evolução exponencial do universo do on-line, a
conjuntura económica inibidora de gastos das famílias em bens “não essenciais”
e, caso particular de Portugal, o baixo nível de hábitos de leitura e consumo
da imprensa escrita, produzem dificuldades de sobrevivência de títulos de qualidade,
chamados de referência, abrindo caminho à chamada imprensa tablóide que, apesar
das oscilações, se mantém relativamente saudável, o que se entende. São também
tablóides os tempos.
Como leitor de jornais desde
muito novo, é sempre com inquietação que penso nestas questões e vou assistindo
ao abaixamento das tiragens em papel, também do Público. Há alguns anos quando
estava aqui no meu Alentejo se não o reservasse não conseguia obtê-lo, agora
tem sistematicamente sobras.
Numa entrevista ao Público há já
algum tempo, um especialista, Tom Rosenstiel afirmava que se o jornalismo, (os
jornais), deixar de ser rentável e, como tal, correr o risco de
desaparecimento, as democracias poderão sofrer um "cataclismo
cívico". Creio que a cidadania de qualidade exige uma imprensa não só
voltada para o imediatismo da espuma dos dias e acredito que apesar das
mudanças em tecnologia e das incidências do mercado a que os jornalistas e os
jornais deverão adaptar-se, os jornais em papel são como os dias, nunca acabam.
Se forem jornais, bons jornais, independentemente do suporte.
Quando escrevo sobre estas
matérias recordo-me sempre de jornais e jornalistas que me têm acompanhado ao
longo da vida e que me fazem manter leitor diário de jornais em papel. É que,
apesar de também consumir informação noutros suportes, não é a mesma coisa.
Sem a preocupação de ser
exaustivo ou seguir qualquer ordem que não seja a memória, algumas referências que
estão dentro da minha mochila. Quando era miúdo aguardava com a maior das
ansiedades que o meu pai chegasse do trabalho no Arsenal do Alfeite para trazer
a Bola já lida por muitas mãos e onde se "aprendia" a ler com o Vítor
Santos ou o Aurélio Márcio.
Lembro-me como a adolescência e
juventude ficaram ligadas a títulos como o Comércio do Funchal com Vicente
Jorge Silva que veio a estar ligado ao aparecimento do Público de que foi, aliás, o primeiro director, o Jornal do
Fundão com o António Paulouro ou o Notícias da Amadora, janelas, frestas, por
onde se espreitava a realidade que um regime espesso e fechado teimava em
esconder e censurar.
Recordo com saudade o Diário de
Lisboa com o suplemento A Mosca com Luís Sttau Monteiro ou as ilustrações do
Abel Manta ou o Diário Popular com o Baptista Bastos que ainda anda por aí. A
circunspecção formal e competente do Diário de Notícias com Mário Mesquita e o
outro Mário, o Bettencourt Resendes, ou a inovação e agitação trazida pelo
Independente de Miguel Esteves Cardoso e Paulo Portas. Não esqueço a abertura
possível verificada com a "ala liberal" de Pinto Balsemão ou Sá
Carneiro ligada ao Expresso que mexeu seriamente com o jornalismo em Portugal.
Relembro o espaço que o Jornal de Letras veio ocupar com José Carlos
Vasconcelos.
Finalmente, o registo do
aparecimento do Público, um companheiro com quem me zango tantas vezes mas que
continua a entrar diariamente cá em casa na versão papel.
A imprescindível sobrevivência
dos jornais, dos bons jornais, para além da qualidade e competência do seu próprio trabalho, garante-se na escola, nos hábitos de leitura, na
educação. Na cidadania.
Aguenta-te Público, fazes falta.
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