De acordo com os primeiros
resultados do Projecto Reincidências – Avaliação da Reincidência dos Jovens Ofensores e Prevenção da Delinquência, da responsabilidade da Direcção-Geral de
Reinserção e Serviços Prisionais, e realizado entre Janeiro de 2013 e Janeiro
de 2015, hoje apresentados em Lisboa, 33.2% dos jovens inquiridos e que já
passaram por uma medida tutelar educativa que pode incluir internamento em
Centro Educativo reincidem na prática de delitos.
O nível ainda elevado de
reincidência mostra a necessidade de uma melhor eficiência nestes processos.
Recordo que a nova Lei Tutelar
Educativa que se aplica a adolescentes e entre os 12 e os 16 anos, prevê a
criação de “casas de autonomização” para receber os jovens condenados por
crimes após o cumprimento de metade da pena nos Centros Educativos.
Permanecerão nestas “casas de autonomização” sob orientação e cumprindo um
conjunto de regras. Esta medida tem como objectivo mediar o processo de
reinserção social e minimizar o risco de reincidência.
Por outro lado, importa não
esquecer que os Centros Educativos, estruturas que acolhem em regime de
internamento, adolescentes envolvidos em casos de delinquência, estarão em
situação de sobrelotação. Os Centros Educativos sentem ainda forte
constrangimento em matéria de recursos humanos pelo que mais dificilmente
cumprem o seu papel fundamental de reabilitação através da construção de
programas de educação e formação profissional.
É de recordar que segundo o
Relatório de Segurança Interna de 2014, a delinquência de jovens foi dos crimes
cuja prevalência subiu nitidamente.
Há algum tempo o I apresentou um
trabalho interessante envolvendo história de jovens que estão nos Centros
Educativos e as suas perspectivas de vida. É inquietante perceber como os
jovens abordados não vislumbravam com confiança um futuro diferente do passado
que ali os trouxe, exclusão e delinquência.
De acordo com um estudo divulgado
há algum tempo realizado no âmbito do Programa de Avaliação e Intervenção
Psicoterapêutica no Âmbito da Justiça Juvenil, promovido pela Direcção-Geral de
Reinserção e Serviços Prisionais e co-financiado pela Comissão Europeia, a
população que está nos Centros Educativos acumula, em geral, mais de três anos
de chumbos na escola e em 80% dos casos é oriunda de famílias de baixo estatuto
socioeconómico.
É ainda relevante que mais de 90%
dos que foram entrevistados têm pelo menos uma perturbação psiquiátrica, “o que
é um dado astronómico”, como classificou Daniel Rijo, professor da Universidade
de Coimbra, um dos autores do trabalho para a DGRSP. Nem todos têm o
acompanhamento que seria necessário, admitiu.
Sempre que estas matérias são
discutidas, os especialistas acentuam a importância da prevenção e da
integração comunitária como eixos centrais na resposta a este problema sério
das sociedades actuais pelo que a resposta recentemente criada, (mas creio que ainda
só no papel) “casas de autonomização” pode constituir-se como um contributo se
dotada de recursos adequados.
As Comissões de Protecção de
Crianças e Jovens, em reestruturação, sentem-se incapazes de acompanhar o
volume de casos das respectivas comunidades, gerando situações, muitas
conhecidas, com fim grave de crianças que depois ficamos a saber que estavam
“sinalizadas” ou “referenciadas”, mas sem resposta.
Sabemos que educação, prevenção e programas
comunitários e de integração têm custos, no entanto, importa ponderar entre o
que custa prevenir e cuidar e os custos posteriores do mal-estar e da
pré-delinquência ou da delinquência continuada e da insegurança.
Parece ser cada vez mais consensual
que mobilizar quase que exclusivamente dispositivos de punição, designadamente
a prisão, parece insuficiente para travar este problema e, sobretudo, inflectir
as trajectórias de marginalização de muitos dos envolvidos mais novos em
episódios de delinquência.
No entanto a discussão sobre
estas matérias é inquinada por discursos e posições frequentemente de natureza
demagógica e populista alimentados por narrativas sobre a insegurança e
delinquência percebida, alimentadora de teses securitárias.
Apesar de, repito, a punição e a
detenção constituírem um importante sinal de combate à sensação de impunidade
instalada, é minha forte convicção de que só punir e prender não basta.
É em todo este caldo de cultura
que nascem e se desenvolvem as sementes de mal-estar.
É urgente que nos questionemos e
questionemos as instituições, em nome dos nossos filhos e dos filhos dos nossos
filhos.
Recordo Brecht, "Do rio que tudo arrasta diz-se que é
violento. Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem".
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