quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

AS METAS CURRICULARES VOLTARAM À AGENDA

Esta questão deve ser vista com prudência e sem “facilitismos” de natureza simbólica tal como afirmei a propósito da extinção do exame do 4º ano.
De facto se a sua existência, só por si, nunca me pareceu um contributo sólido para a qualidade da educação o que é suportado por estudos, comparações e relatórios internacionais, a sua extinção, só por si, também não traz qualidade. Importa ainda considerar a importância da existência de dispositivos de avaliação externa.
Na mesma linha deverá ser cauteloso o processo relativo às metas curriculares embora tenhamos sempre de considerar a tentação do “ímpeto reformista” que as sucessivas equipas do ME sentem levando o sistema a uma deriva inconsequente e com efeitos negativos.
Estou perfeitamente à vontade porque desde o início afirmei que as metas curriculares, tal como estão definidas, são parte do problema e não parte da solução. Trabalhos como o da Professora Dulce Gonçalves da Universidade de Lisboa sobre o 1º ciclo, a posição da esmagadora maioria das associações profissionais de professores e o contacto com muitos professores e escolas mostram a tremenda dificuldade criada a professores e alunos pela forma como estão definidas as metas curriculares.
No entanto, insisto, a mudança deve ser muito cautelosamente e solidamente preparada.
As metas curriculares, com esta ou outra designação podem e devem funcionar como uma ferramenta orientadora e útil para o trabalho de alunos e professores. Para que isso aconteça deverão ser de simples utilização e operacionalização e decorrentes de modelos curriculares diferentes dos actuais, demasiado extensos, prescritivos e espartilhados.
Como exemplo vejamos apenas o 1º ciclo em Matemática e Português. Em Matemática são definidos 3 domínios que se desdobram como segue. No 1º ano, em 8 sub-domínios, 13 objectivos e 62 descritores, no 2º ano em 11 sub-domínios, 22 objectivos e 82 descritores, no 3º ano em 11 sub-domínios, 22 objectivos e 98 descritores e no 4º ano em 6 sub-domínios, 15 objectivos e 81 descritores o que em síntese corresponde a 72 objectivos e 323 descritores para Matemática do 1º ciclo.
Se juntarmos Português teremos um total de 177 objectivos e 703 descritores. Por anos, temos: no 1º ano, 33 objectivos e 143 descritores; no 2º, 47 objectivos e 168 descritores; no 3º, 51 objectivos e 202 descritores e no 4º, 46 objectivos e 190 descritores. É obra, uff.
O Programa de Português para o ensino Básico estabelece perto de 1 000 metas curriculares,
Este entendimento pode levar a que o ensino se transforme na gestão de uma espécie de "check list" das metas estabelecidas implicando a impossibilidade de acomodar as diferenças, óbvias, entre os alunos, os seus ritmos de aprendizagem.
Aliás, neste contexto recordo a afirmação dos autores das metas curriculares, de que estas estabelecem o que os alunos deverão imprescindivelmente revelar, “exigindo da parte do professor o ensino formal de cada um dos desempenhos referidos nos descritores”.
Este cenário, aplicado em todas as áreas ou disciplinas, em turmas de 26 alunos no 1º ciclo e de 30 a partir do 5º ano, constituídas por alunos com ritmos diferentes e assimetrias nos seus percursos e competências, deixa-me uma imensidade de dúvidas sobre a aplicação das metas curriculares, tal como estão definidas actualmente.
Em síntese, sim esta situação necessita ajustamentos mas “depressa e bem não há quem” e as “reformas” devem ser preparadas com competência, com participação, com recursos e com tempo.

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