terça-feira, 28 de agosto de 2012

ESTAMOS TROIKADOS

Embora já tivessem sido avistados na costa portuguesa há uns dias, os tubarões da troika só hoje começam a avaliar o trabalho realizado na feitoria em que nos tornámos para, assim, decidir sobre as nossas vidas. A questão assenta, como não podia deixar de ser, sobre o aumento da nossa carga de trabalhos, perdão, da austeridade.
São muitas as vozes que alertam para a insustentabilidade de mais medidas de austeridade.
Mesmo o esfíngico Presidente da República na austera gestão das suas intervenções, afirmou que não é possível impor mais austeridade. No entanto, o Primeiro-ministro tem afirmado que pode ser necessária mais austeridade. Nada de estranho, "custe o que custar", tem que cumprir os objectivos do negócio com a troika e os objectivos da sua própria política "over troika", como tal, não pode assegurar que não seja necessária mais "austeridade", sendo ainda de esperar o aumento do desemprego, por exemplo.
Para além desta discussão, mais ou menos austeridade, o que nos preocupa seriamente são as condições de vida que muita gente está já a enfrentar, estamos a falar de pessoas, não de políticas, ou melhor estamos a falar do efeito das políticas na vida das pessoas.
Parece de relembrar que um estudo recente da insuspeita, nesta matéria, Comissão Europeia que analisou a distribuição dos efeitos dos programas de austeridade os países que experimentam maiores dificuldades, Portugal, Grécia, Espanha, Irlanda, Estónia e Reino Unido, conclui que Portugal "é o único país com uma distribuição claramente regressiva", traduzindo, os pobres estão a pagar mais do que os ricos quando se aplica a austeridade. Pode ainda ler-se que nos escalões mais pobres, o orçamento de uma família com crianças sofreu um corte de 9%, ao passo que uma família rica nas mesmas condições perdeu 3% do rendimento disponível.
Portugal é ainda de acordo com o estudo o único país analisado em que "a percentagem do corte (devido às medidas de austeridade) é maior nos dois escalões mais pobres da sociedade do que nos restantes". A Grécia, que tem tido repetidos pacotes de austeridade, apresenta uma maior equidade nos sacrifícios implementados.
Este dado parece-me extremamente relevante nesta discussão sobre a eventual necessidade de mais "austeridade" e mostra, de acordo com a percepção comum, que não existe equidade na repartição dos sacrifícios.
Para além de contrariar o discurso oficial de que existe justiça social nas medidas de austeridade, o que é verdadeiramente insustentável é de que as políticas assumidas, por escolha de quem decide, estão a aumentar as assimetrias sociais, a produzir mais exclusão e pobreza. Mais preocupante a insensibilidade da persistência neste caminho.
Eu sei, sabemos todos, que a questão da pobreza é um terreno que se presta a discursos fáceis de natureza populista e ou demagógica, sem dúvida. Mas também não tenho dúvidas de que os problemas gravíssimos de pobreza que perto de dois milhões de portugueses conhecem, um milhão de desempregados, exigem uma recentração de prioridades e políticas que não se vislumbra.
O abismo está mais perto, não está mais longe, como Passos Coelho sustenta. A realidade não é a projecção dos seus desejos, dramaticamente.
Vamos ver que como os mestres tubarões da troika avaliarão o trabalho realizado na feitoria e o que entendem sobre o futuro destes miseráveis do sul, nós.

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