Francisco José Viegas, Secretário de Estado da Cultura,
afirma em entrevista ao Le Monde que “Vivemos numa sociedade que perdeu os seus
sonhos, os portugueses têm medo do futuro”. Para isto aponta razões de natureza
histórica e o facto de que ”Perdemos a nossa agricultura, a nossa pesca e a
nossa indústria já pouco conta. Só nos resta a nossa cultura e o mar como
oferta turística”.
É evidente que de um escritor não será estranho alguma
liberdade criativa, mas julgo que vale a pena considerar duas ou três notas.
Quando se afirma que “perdemos" a agricultura, pesca e a indústria é
pouco significativa, parece-me mais ajustado dizer que por responsabilidade das
políticas e modelos de desenvolvimento, que Francisco José Viegas também
representa, nós não “perdemos”, foram destruídas, sim, foram destruídas em nome
de políticas que criteriosamente algumas décadas de centrão foram executando.
À boleia da destruição da agricultura, pesca e indústria, da
betonização do país, de modelos construção selvagem que destruíram cidades e litoral,
da tal oferta turística massificada e frequentemente sem qualidade, hipotecámos
o futuro.
Nós não perdemos os sonhos, nós estamos a perder a esperança
com o roubo feito ao futuro e aos sonhos, o que é diferente.
Na verdade, Francisco José Viegas tem razão quando refere o
peso da história, designadamente os cinquenta anos de Estado Novo. Do meu ponto
de vista essa herança ainda está presente na forma como, estranhamente,
resignadamente, vamos convivendo com uma classe de dirigentes políticos,
económicos e culturais que são, de facto responsáveis pelo quadro que nos envolve
e dos sonhos que foram, são, roubados.
Por outro lado, também historicamente, o Povo já não se
levanta e faz uma revolução. Os modelos de democracia representativa parecem
enraizados, integrados, mas são de particular má qualidade em Portugal. A
participação e envolvimento cívico dos cidadãos foram capturados pela
partidocracia e fora dos aparelhos partidários não tem expressão, por enquanto.
Francisco José Viegas não se pode, como é habitual,
colocar-se como espectador que assiste de fora ao que vai acontecendo.
Francisco José Viegas é um actor principal nesta narrativa.
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