sábado, 25 de agosto de 2012

CONSULTA RAPIDINHA

Ao que refere o Público, dois sindicatos representativos da classe médica aceitam aumentar o número de utentes por cada médico de família a troco de compensações salariais “por desempenho”. A medida, que poderá passar de uma média de 1550 utentes por clínico para mais de 1900, permitiria, sustentam os sindicatos, diminuir significativamente o número de cidadãos sem médico de família, muitas centenas de milhar, situação verdadeiramente inaceitável, para mais nos tempos de dificuldades que atravessamos.
Não vou discutir a proposta do ponto de vista técnico, mas gostava de deixar uma nota. Alguns lembrar-se-ão de algo que veio a público sobre a avaliação dos médicos no âmbito do Sistema Integrado de Avaliação de Desempenho adaptado à carreira médica.
Não está em causa, obviamente a avaliação de desempenho, é uma ferramenta imprescindível à promoção da qualidade e eficácia de pessoas e instituições pelo que faz todo o sentido definir um modelo de avaliação também para os médicos.
As minhas dúvidas começam quando entre os critérios se enuncia produtividade e "atitude profissional e comunicação" com colegas, superiores, doentes e utentes, questão que hoje recordo a propósito do aumento de utentes por médico e do pagamento “por desempenho”.
Sabe-se que existem muitos milhares de pessoas sem médico de família que lutam por uma consulta, sem garantia de a conseguir, indo a meio da noite para a porta do centro de saúde. Sabe-se que existem médicos de família que são responsáveis por milhares de doentes. Muitas das pessoas que recorrem às consultas são idosas que frequentemente sofrem de “sozinhismo”, a doença de quem vive só, que se minimiza no convívio com outros sós na sala de espera e na atenção de um médico que escuta, por vezes, mais a dor da alma que as dores do corpo.
Neste cenário como avaliar "atitude" e "comunicação". Já estive envolvido em circunstâncias, pessoais ou acompanhando familiares, em que o médico claramente estava pressionado pelo tempo que (não) podia dedicar, a atitude que não podia demonstrar, a comunicação que não podia estabelecer. As muitas pessoas com horas de espera na sala inibem-no na "atitude e comunicação" e pressionam-no na "produtividade".
Temo que o aumento de utentes por médico e a pressão acrescida sobre os profissionais, que beneficiarão de acréscimos remuneratórios “por desempenho”, possa melhorar a “produtividade” mas ameace a qualidade.
Ainda assim, nada que se estranhe num tempo em que os números mandam nas pessoas.

1 comentário:

anónimo paz disse...

Não vou dissecar o método Hondt.

Faço apenas uma pergunta: Porque motivo o poder político não aproveita a boleia do aumento de doentes por cada médico de família e aumenta o número de eleitores necessários para que um deputado seja eleito por cada círculo?

Mistério...Mistério... Mistério... Ou não?!


saudações