Estranhamente, passou relativamente despercebida e
sem sobressaltos a informação divulgada
ontem, creio, de que apenas 43.5 % dos desempregados beneficia do subsídio de
desemprego. Esta informação assenta em dados do INE e da Segurança Social
referentes a Junho. É assustador, não chega a metade o número de pessoas que
está sem emprego e que recebe o subsídio.
Este número vai, provavelmente crescer, pois
começa a esgotar-se o período em que se usufrui de subsídio, entretanto
encurtado, envolvendo as pessoas que caíram no desemprego a partir de 2009, o
ano em que os aspectos mais gravosos da crise nos começaram a atingir.
A este cenário acresce, ainda de acordo com o IEFP,
que, no último ano, o número de casais com ambos os elementos no desemprego
duplicou, subiu 97.38 % para cerca de 5 600 e o valor médio dos subsídios de
desemprego tem vindo a baixar.
Há tempos foram divulgados alguns dados referindo
que cerca de 200 000 pessoas já terão desistido de procurar emprego, não
constando sequer dos números do desemprego. Este quadro impressionante levanta
uma terrível e angustiante questão. Os milhares, muitos, de pessoas envolvidas
vão (sobre)viver de quê?
Sendo de esperar a continuação de um período
recessivo e, portanto, sem crescimento, torna-se impossível criar a riqueza
necessária e redistribuí-la de forma socialmente mais justa para minimizar esta
tragédia.
É certo que em Portugal a chamada economia
paralela corresponde a cerca de 24% do PIB e muita gente e muitas actividades
estão envolvidas neste universo, de qualquer forma o potencial impacto social
destes números é, no mínimo, inquietante.
Afirmo com frequência que uma das consequências
menos quantificável das dificuldades económicas, sobretudo do desemprego, em
particular o de longa duração e de situações em que o tempo obriga a perder o
subsídio, é o roubo da dignidade às pessoas envolvidas. Sabemos que se verifica
oportunismo e fraude no acesso aos apoios sociais, mas a esmagadora maioria das
pessoas sentem a sua dignidade ameaçada quando está em causa a sobrevivência a
que só se acede pela “mão estendida” que envergonha, exactamente por uma
questão de dignidade roubada.
A questão da pobreza é um terreno que se presta a
discursos fáceis de natureza populista e ou demagógica, sem dúvida. Mas também
não tenho dúvidas de que os problemas gravíssimos de pobreza que perto de dois
milhões de portugueses conhecem, exigem uma recentração de prioridades e
políticas que não se vislumbra. De forma quase insultuosa e obscena alguns
governantes insistem, no "não está bem, mude-se, pire-se, emigre" e
até já ouvi um deles falar em que as pessoas devem "abandonar a sua zona
de conforto". Zona de conforto?! Sem presente e sem futuro, zona de
conforto?! Tenham tento e respeito pela dignidade, coisa que está em extinção. Por
outro lado, continuamos a verificar a existência de mordomias, condições
e entidades envolvendo a própria administração que são inúteis, obscenas e inaceitáveis.
A pobreza e a exclusão deveriam envergonhar-nos a
todos, a começar por quem lidera, representam o maior falhanço das sociedades
actuais.
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