Embora a escrita que vou deixando no Atenta
Inquietude sempre remeta para a realidade nacional, alguns episódios ocorridos
fora de portas têm merecido referência esporádica pelas suas implicações, mesmo
para nós.
Nesta perspectiva, retomo o caso de Anders
Breivik que assassinou 77 pessoas, na maioria jovens, na Noruega e que foi agora condenado a 21 anos
de prisão por um Tribunal que o considerou são. É evidente que alguém que
realizou o que Breivik fez, da forma que o fez, não pode ser uma pessoa
saudável ainda que seja imputável, justamente o que aconteceu. Na altura, um
sentimento de perplexidade terá sido o que melhor caracterizou a sociedade
norueguesa. Porquê?
Acontece que com uma regularidade
impressionante têm ocorrido episódios desta natureza ainda que, felizmente, com menor
gravidade, lembremo-nos de situações em Inglaterra, nos Estados Unidos,
em França ou na Finlândia, o que torna fundamental, refiro-o muitas vezes, que
estejamos atentos e inquietos. Em alguns casos, lembro-me, por exemplo, dos distúrbios
em Inglaterra, os comportamentos observados assemelhavam-se grotescamente a um
videojogo violento com personagens reais.
Também em Portugal se verificaram alguns casos de
violência extrema envolvendo jovens, levando-nos a questionar os nossos
valores, códigos e leis pela perplexidade que nos causam.
A atenção e inquietação que refiro devem
dirigir-se e tentar perceber um processo que designo como "incubação do
mal", que se instala nas pessoas, muitas vezes logo na adolescência, a
partir de situações de mal-estar que podem passar relativamente despercebidas
mas que, devagarinho, insidiosamente, começam interiormente a ganhar contornos
que identificam os alvos, por vezes difusos, sentidos com os causadores desse
mal-estar.
A fase seguinte pode passar por duas vias, uma
mais optimista em que alguma actividade, socialmente positiva possa drenar esse
mal-estar, nessa altura já ódio e agressividade, ou, a outra via, aumenta
exponencialmente o risco de um pico que pode ser um tiroteio numa escola, a
bomba meticulosamente e obsessivamente preparada ou o ataque a uma concentração
de jovens de um partido que representa o "mal" ou a vinda para a rua
numa espiral de violência cheia de "adrenalina", em nome de coisa
nenhuma a não ser de um "mal-estar" que destrói valores e gente.
Por mais policiada que seja uma sociedade, é
extraordinariamente difícil prevenir processos desta natureza em que o mal se
vai incubando e em que as ferramentas de acção estão acessíveis. Provavelmente,
a questão não é abdicar da abertura e da tolerância que caracteriza a nossa
sociedade elevando o policiamento das comunidades a níveis asfixiantes. O lidar
com este tipo de problemas, a iniciativa individual de natureza terrorista, ou
os movimentos grupais descontrolados e reactivos, passará sobretudo por uma
permanente atenção às pessoas, ao seu bem-estar, tentando detectar, tanto
quanto possível, sinais que indiciem o risco de enveredar por um caminho que se
percebe como começa, mas nunca se sabe como acaba.
Na Noruega, na Inglaterra, nos Estados Unidos, em
França ou em Portugal.
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