segunda-feira, 14 de maio de 2012

O TRABALHO DE CASA. Um texto esquisito

Rodrigo, não há uma única vez que te pergunte pelo trabalho de casa que o tenhas realizado. Assim, não é de ficar admirado com as nota que tens, porque não fazes o trabalho de casa?
Setôra, vou tentar explicar. O meu contexto familiar tem algumas características particulares, específicas. O meu pai está desempregado há uns dois anos e a minha mãe, que trabalha em situação precária em limpezas teme ser despedida também, chora pelos cantos embora procure disfarçar. O meu pai já desistiu de ler anúncios e ir a entrevistas. Já lhe expliquei que é preciso sair da zona de conforto e até tentar a emigrar, mas ele diz que lhe custa deixar a família nesta situação. Também lhe disse que é preciso ser optimista e ver no desemprego uma oportunidade mas ele achou que eu estava a gozar e quase me batia. O meu irmão, o João, a Setôra conhece, ele andou aqui na escola, desistiu de estudar e também não consegue arranjar trabalho. Expliquei-lhe que é preciso ser empreendedor, os jovens devem ser empreendedores, criar o seu próprio emprego mas ele não percebeu o que eu estava a dizer e também ia apanhando com um sapato que ele me atirou. A situação já não estava fácil, acontece que a minha irmã Cátia também ficou com o marido desempregado e como não podiam pagar a casa, teve que ficar sem ela e vieram viver para a nossa. Ficou com o quarto que era do João e meu e nós dormimos na sala. O meu avô já quase não pode andar mas mesmo assim ainda vai durante o dia para o Centro Paroquial que o vem buscar e trazer. O ambiente não é o melhor mas procurei dizer que também era bonito ter assim a família toda junta, várias gerações a conviver, mas ficaram todos a olhar para mim, pensei que me queriam bater, mas não, só me chamaram maluco. Compreende a Setôra que as condições objectivas não são muito favoráveis à realização do trabalho de casa. Aguardo uma nova oportunidade, os jovens não devem desistir mas, na verdade, não está fácil.
Rodrigo ... estou ... sem palavras.
Pois é Setôra, eu, como a Setôra pode verificar ... palavras tenho. Só me falta ... o resto.

3 comentários:

L.Maria disse...

O texto não esquisito, esquisita é a realidade, esquisito é tentar tapá-la, escondê-la ou fingir que não existe... Esquisito é estar completamente a leste desta realidade...

anónimo paz disse...

O Rodrigo está possesso do espírito e da leitura deturpada que Pedrinho Passos Coelho faz da realidade.

Boa imaginação e óptimo texto político. PARABÉNS!


saudações

Luis Fernandes disse...

Mais um texto SUBLIME. Um grd abraço