Continuam a merecer discussão as
afirmações do Primeiro-ministro considerando que o "desemprego pode ser
uma oportunidade para mudar de vida" e "não tem de ser visto como
negativo". Aliás, o Público dedica hoje um extenso trabalho a esta matéria,
ouvindo vários especialistas que divergem, claro, na opinião.
Umas notas breves, de um não
especialista, sobre a questão da comunicação, sobretudo da lideranças políticas
e que se justificam por sucessivos episódios. A título de exemplo relembro
afirmações sugerindo, aconselhando, a
emigração, a necessidade de se sair da "zona de conforto" ou ainda a
famosa referência à necessidade de não sermos "piegas".
A primeira questão é exactamente
essa, o peso social do mensageiro condiciona o conteúdo da mensagem, ou seja, a
mesma frase não tem o mesmo valor afirmada por um cidadão comum ou proferida
por uma figura com responsabilidades de decisão sobre a vida das pessoas. Assim
sendo, as lideranças políticas assumem maior responsabilidade pelas afirmações
que fazem.
Uma segunda nota prende-se com a
justificação das afirmações, o seu conteúdo e forma. Todos os dias a imprensa e
responsáveis de instituições de solidariedade social nos dão conta de situações
de pessoas, milhares de pessoas, que estão a viver abaixo de um limiar que lhes
garanta padrões mínimos de qualidade de vida, incluindo dificuldades de
alimentação afectando crianças. Conhecemos muitas histórias de inacessibilidade
a tratamentos e serviços de saúde por dificuldades económicas. Muitos milhares
de famílias têm entregado as suas casas à banca por incumprimento de créditos,
etc. Para muitas destas pessoas, afirmações como as que estão em análise são
quase insultuosas e, portanto, inaceitáveis. Na verdade, este cenário
devastador aumenta a pressão sobre o discurso
dos líderes políticos, exactamente os que são responsabilizados pelos problemas
ou, pelo contrário, de quem se espera a minimização desses problemas.
Pode sempre afirmar-se que haverá
alguma razão nas afirmações ou que a
intenção não é a de desvalorizar os dramas que afectam muitos milhares
de pessoas.
No que respeita à eventual razão,
mesmo que em algumas situações pudessem ser entendidas, toda a gente as ouve
pelo que não podem deixar de se sentir envolvidas e agredidas. Quanto à
intenção, a sua não existência, e acredito que não exista, não colhe. Numa
certa altura do desenvolvimento dos miúdos, o seu desenvolvimento moral e
intelectual leva-os a considerar que a sua não intenção de realizar algo,
desculpa o que aconteceu, tal entendimento traduz-se no frequente "foi sem
querer" e como "foi sem querer", não tem problema.
A questão é que os líderes
políticos, os que verdadeiramente são líderes, apesar de não possuírem,
felizmente, o dom da infalibilidade e da perfeição, não podem, não devem proferir
determinadas palavras e persistirem teimosamente na sua afirmação.
São palavras mal ditas.
2 comentários:
Dizer que são...PALAVRAS MAL DITAS...é branqueamento!
O menino Pedrinho P. Coelho tem lapsos (muitos) de sensibilidade social. Eufemistícamente falando claro. Mas não é admissível tais lacunas em quem ocupa o cargo de 1º Ministro.
Mas o Povo encarrega-se de ensinar a pensar quem nunca pensou ou quem se esquece de pensar. É questão de dar tempo ao tempo...
saudações
Belo post! Subscrevo em pleno!
É bom que se relembre tudo isto a quem quer desvalorizar e dizer que são "meras palavras"...
Bom Domingo!
Anónimo Paz:
o pior é se o povo o ensina a pensar já tarde demais....
O pior é que não tem pudor em debitar pensamentos teóricos de outros e achar que isso é normal, que pensar no povo que governa não interessa para nada.
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