Poderíamos continuar centrados nos
desenvolvimentos da novela protagonizada pelo sinistra figura do Ministro
Miguel Relvas, mas na verdade existem questões bem maiores, por mais importantes
que estes episódios possam ser. Em Relatório da UNICEF, "Medir a pobreza
infantil", a divulgar hoje, Portugal surge em 25º lugar nos 29 considerados.
Segundo dados de 2009, situação que se terá agravado, 27% das crianças
portuguesas são carenciadas, no subgrupo famílias monoparentais a taxa sobe
para 46.5 % e em famílias com ambos os pais desempregados a taxa de crianças
carenciadas dispara para 73.6%. No mesmo
Relatório a UNICEF considera que 14,7% das crianças portuguesas vivem abaixo do
limiar de pobreza.
Não são dados surpreendentes a não ser no seu
volume que é assustador. As dificuldades das famílias e o que dessas
dificuldades penaliza e ameaça os mais pequenos, é demasiado importante para
que não insistamos nestas questões e deveriam constituir a maior preocupação de
uma comunidade que pense no futuro.
Há algum tempo, um estudo do ISEG apontava para
que cerca de 40% das crianças e adolescentes vivessem em situação de pobreza,
sendo que esse quadro de privação afecta sobretudo os padrões e a qualidade da
alimentação. O estudo sublinhava também, entre ouros indicadores, que o grupo
etário 0-17 anos é o mais vulnerável ao risco de pobreza tendo ultrapassado o
dos mais velhos.
Por outro lado, relembro um estudo de há uns
meses realizado pelo I junto das autarquias dos distritos de Lisboa, Porto,
Setúbal, Coimbra e Faro que revelou que quase metade dos alunos da educação
pré-escolar e do 1º ciclo recebe apoios sociais sendo que em alguns concelhos a
percentagem de crianças carenciadas atinge os 65%, número verdadeiramente
impressionante. Acresce que em muitos concelhos a maioria das crianças apoiadas
integram o escalão A dos apoios, o que se destina aos agregados com rendimentos
mas baixos.
Relembro que foi decidido há semanas providenciar
pequeno-almoço às crianças nas escolas bem como, e isso tem acontecido em
muitas circunstâncias, a abertura das cantinas escolares no período de férias,
o alargamento do número de cantinas sociais ou da resposta nas instituições de
solidariedade social. A medida peca por tardia, muitas crianças têm como
alimentação não muito mais do que aquilo que as escolas lhes providenciam, como
bem sabem as pessoas que se movem no universo da educação.
Estes indicadores sobre as dificuldades que afectam
a população mais nova são algo de assustador. Esta realidade não pode deixar de
colocar um fortíssimo risco no que respeita ao desenvolvimento e sucesso
educativo destes miúdos e adolescentes e portanto, à construção de projectos de
vida bem sucedidos. Como é óbvio, em situações limite como a carência
alimentar, estaremos certamente em presença de outras dimensões de
vulnerabilidade que concorrerão para futuros preocupantes.
É por questões desta natureza que a contenção das
despesas do estado, imprescindível, como sabemos, deveria ser feita com
critérios de natureza sectorial e não de uma forma cega e apressada,
naturalmente mais fácil mas que, entre outras consequências, poderá empurrar
milhares de crianças para situações de fragilidade e risco com implicações
muito sérias.
Miúdos carenciados aprendem pior e vão continuar
pobres.
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