A imprensa de ontem e hoje faz-se eco dos relatos de responsáveis por instituições de solidariedade social que referem, sem surpresa, o aumento da procura por ajuda.
Os responsáveis têm vindo a referir que, para além do aumento de pedidos, emergem de forma significativa os pedidos realizados por gente mais jovem e por pessoas com emprego. Relativamente aos mais jovens sabemos que este grupo etário é o mais afectado pelo desemprego e começa a ser urgente uma atenção muito sólida à degradação da qualidade do emprego, a causa próxima do risco de pobreza entre pessoas empregadas.
De facto, nos últimos tempos cresceram exponencialmente os casos do que se pode chamar de “pobreza envergonhada”, sobretudo devido a desemprego mas também devido à falta de qualidade do emprego, aumentos e perdas salariais. São pessoas que se julgavam a coberto deste tipo de riscos e que sentem um embaraço pessoal e social enorme para assumir as dificuldades porque passam.
Este cenário é absolutamente extraordinário. Para além das consequências óbvias das dificuldades ainda se torna necessário, como várias vezes aqui tenho referido, acautelar a dignidade das pessoas afectadas. De facto, umas das consequências menos quantificável das dificuldades económicas, sobretudo do desemprego, em particular o de longa duração e de situações em que o tempo obriga a perder o subsídio, é o roubo da dignidade às pessoas envolvidas. Sabemos que se verifica oportunismo e fraude no acesso aos apoios sociais, mas a esmagadora maioria das pessoas sentem a sua dignidade ameaçada quando está em causa a sobrevivência a que só se acede pela “mão estendida” que envergonha, exactamente por uma questão de dignidade roubada.
A questão da pobreza é um terreno que se presta a discursos fáceis de natureza populista e ou demagógica, sem dúvida. Mas também não tenho dúvidas de que os problemas gravíssimos de pobreza que perto de dois milhões de portugueses conhecem, exigem uma recentração de prioridades e políticas que não se vislumbra. Curiosamente, até da área política mais próxima do actual governo surgem críticas às opções que têm vindo a ser assumidas.
A envergonhada pobreza deveria envergonhar-nos a todos, a começar por quem lidera. A liderança que transforma é uma liderança com responsabilidade social e com sentido ético.
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