terça-feira, 22 de novembro de 2011

É IMPORTANTE DESPERTAR OS JOVENS PARA A CULTURA CIENTÍFICA. A sério?!

“O país não está a conseguir educar os jovens”, “é importante despertar os jovens para a cultura científica”, “a importância do ensino experimental” são enunciados de uma densidade científica e pedagógica admirável. O autor, feroz opositor a retóricas vazias em matéria de discursos sobre a educação, é o Ministro Nuno Crato.
É sempre estimulante o confronto com o seu pensamento, mas isto, desculpar-me-ão, para não variar, é nada.
Continuo a entender que um aspecto fundamental contributivo para o insucesso preocupante que nos afecta e não só em matéria de cultura científica se prende com a organização e conteúdos curriculares. Sem uma mudança séria neste universo, sempre anunciada e sempre adiada parece-me difícil esperar melhorias significativas e sólidas, não artificiais, nos conhecimentos dos miúdos e na qualidade do trabalho global das escolas. Nesta mudanças assumem especial centralidade as duas ferramentas fundamentais de acesso ao conhecimento, o domínio do português e da educação matemática.
Se repararmos na matriz curricular em vigor parece relativamente claro que o tempo de trabalho destinado a português e à educação matemática, apesar do acréscimo recentemente decidido, dificilmente permitirão obter melhores resultados, apesar de iniciativas como o Plano Nacional de Leitura ou o Plano de Acção para a Matemática ou do trabalho das escolas que, através de dispositivos de apoio próprios, tentam minimizar as dificuldades de muitos alunos. Dado o volume de dificuldades e os recursos das escolas, estas iniciativas acabam, em regra, por ter como destinatários menos alunos do que o necessário.
Defendo um primeiro ciclo com seis anos e uma reorganização de conteúdos para estes primeiros anos de escolaridade obrigatória em que o Português e a Educação Matemática ocupem um lugar central.
Creio que de uma forma geral se entende que o correcto domínio da língua de trabalho, o português, é um requisito fundamental para as aprendizagens em todas as áreas curriculares, bem como a literacia matemática, base do conhecimento científico. Não se compreende, portanto, o pouco peso curricular dado ao português e à educação matemática, sobretudo no 2º ciclo em pleno processo de aquisição das ferramentas básicas de domínio da língua nas suas várias dimensões.
Assim sendo, independentemente da boa vontade de escolas e docentes ou de planos de natureza supletiva, a questão central remete para mais e melhor trabalho em dois domínios essenciais, a língua portuguesa e a educação matemática.
Considero também que o número de disciplinas e a extensão e natureza dos conteúdos curriculares se associam às questões mais frágeis do sistema educativo, designadamente no 3º ciclo, insucesso, absentismo e indisciplina, tudo dimensões fortemente ligadas aos níveis de motivação e funcionalidade percebida dos conteúdos curriculares. A lógica da "disciplinarização" excessiva dos saberes tem informado o sistema educativo mas também o sistema de formação de professores durante demasiado tempo, o que suporta esta disciplinarização sem sentido. É, aliás, curioso notar, se bem estivermos atentos, a frequência com que a propósito de qualquer saber, se defende a existência de mais uma disciplina.
No contexto actual e apesar dos esforços e práticas excelentes desenvolvidas por muitos professores, “despertar os jovens para a cultura científica” ou sublinhar a “importância do ensino experimental”, seja lá isso que for, não passa de eduquesas pérolas.

1 comentário:

LM disse...

Absolutamente de acordo!