Mais uma disciplina, “educação financeira”, mais um manual a juntar às montanhas de metas curriculares,
manuais, cadernos de fichas e de actividades que submergem alunos e
professores. Ainda não há muito tempo se defendia a criação de uma área de “empreendedorismo”
que poderia, eventualmente, ser integrada nesta área.
Por diversas ocasiões tenho aqui
manifestado a minha reserva face ao entendimento de que tudo o que possa de
alguma forma dizer envolver os mais novos deve ser ensinado na escola. Esta visão
obesa da escola não funciona, nem tudo deve ser transformado em disciplinas
escolares, para além de que a escola tem um conjunto de funções incontornáveis
que tornam finita a sua capacidade de responder.
Por outro lado, tem vindo a
desenhar-se, não só em Portugal mas também em Portugal, a ideia de uma
educação, de uma escola, fundamentalmente centrada em competências
instrumentais, em saberes “úteis”, "essenciais" como lhes chama Nuno
Crato, que forme “técnicos” e não “cidadãos” qualificados. Os currículos são
progressivamente aliviados de conteúdos que não sejam “práticos”, promotores de
“produtividade”, “domínio de técnicas” como seja toda a área da formação
cívica, dos valores, das expressões e conteúdos artísticos, etc.
A escola deve formar empresários,
poucos, e técnicos qualificados e de formação estreita, muitos.
Estas ideias traduzem-se nos
conteúdos curriculares, nos modelos de avaliação, nas concepções do que deve
ser o trabalho dos professores, na organização do sistema educativo, selectivo,
prescritivo e incapaz de acomodar diferenças entre os alunos, etc.
No entanto e independentemente
das opções e visões ideológicas, uma das questões que no universo a educação
estarão sempre em aberto é a que envolve os conteúdos e organização curricular.
De facto, a velocidade de produção e acesso ao conhecimento e ao desenvolvimento,
as mudanças nos sistemas e no quadro de valores das comunidades determinam a
regular reflexão e ajustamento sobre o que a escola deve ensinar, sobretudo
durante a escolaridade obrigatória. Por outro lado, o tempo da escola e a
competência da escola são finitos, isto é, a escola não tem tempo nem pode ou
deve ensinar tudo. Lembram-se certamente das discussões sobre se matérias como
educação sexual, educação cívica ou educação para a saúde, para citar apenas
alguns exemplos, deverão, ou não, constituir-se como "disciplinas" e
integrar os currículos escolares.
Vejo sempre com algumas reservas
estas propostas de introdução de mais uma disciplina, mais um manual, como se a
escola, o currículo escolar, pudesse continuar a engordar indefinidamente.
Como é evidente, existirão
conteúdos ou competências dentro do universo do que possa ser "educação
financeira" que poderão integrar o trabalho escolar. Estou a lembrar-me da
educação matemática, evidentemente, mas também da promoção da autonomia,
reflexão, criatividade, regulação, análise, etc., etc. que são inerentes à
própria formação escolar e pessoal e não necessariamente confináveis a uma só
disciplina.
Na verdade, nem tudo o pode ser
interessante saber terá de caber numa disciplina da escola e nem tudo o que se
pode saber se aprende na escola.
3 comentários:
Esta é a derradeira prova de fracasso do Governo de Passos Coelho.
Depois de quatro anos a promover o "fazer mais com menos", chegam à conclusão de que é necessário criar a disciplina de Educação Financeira para que os malandros dos portugueses aprendam a não "viver acima das suas possibilidades"?
Quase metade dos alunos da minha escola é subsidiada pela Ação Social Escolar, ou seja, oriunda de famílias com muito parcos rendimentos. Se esses meninos não conseguirem encontrar maneira de gerir o reduzido orçamento familiar, vivendo condignamente, alimentando-se de forma adequada, pagando as contas indispensáveis, como água, luz, gás... deverão ser avaliados com negativa? Mesmo os filhos de desempregados que se encontram a viver do rendimento social de inserção, das ajudas sociais ou da família?
Tenham dó e vão brincar às invenções para outra banda!
Os miúdos são sempre o grupo mais vulnerável em situações de crise.
Introdução à Economia.
No meu tempo, disciplina obrigatória no 9º ano. Aprender os fundamentos da coisa, bem melhor do que propagandas avulsas ao sabor das agendas políticas e ideológicas do momento.
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