No Público de hoje encontra-se um trabalho sobre o (mau) comportamento dos mais novos que julgo merecer leitura e reflexão embora alguns dos seus fundamentos solicitem prudência na sua consideração. As birras e outros comportamentos das crianças são diariamente uma
fonte de inquietação, designadamente, para pais.
Algumas notas breves sobre este
universo em complemento do trabalho referido.
Acontece com razoável frequência
quando se assiste ou se comentam alguns comportamentos dos miúdos, sobretudo
quando se trata de birras ou a imposição de desejos ou vontades aos adultos,
quase sempre os pais, surgirem explicações como “é dos mimos”. Neste tipo de
diálogos, “mimos” é entendido quase como sinónimo de “afecto”, “amor”,
“gostar”, etc.
Tal justificação costuma depois
servir para se afirmar a ideia de que as crianças hoje em dia têm muitos mimos
que as estragam, dito de outra maneira, têm “afecto” a mais ou ainda “gosta-se
de mais” das crianças. Estes discursos parecem-me sempre muito curiosos pois assentam, do meu ponto de vista, num enorme equívoco.
As crianças, de uma forma geral,
não terão afecto ou elogios a mais, pode existir “afecto a mais” "elogio
excessivo" mas se for excessivo é mau afecto é mau elogio. Não é mau por
ser muito, é mau porque asfixia, oprime, não deixa que os miúdos cresçam,
distorce a percepção da criança de si própria. Mas não é este o tipo de
situações que leva as pessoas a falar dos mimos ou dos elogios a mais.
Insisto, as crianças não têm
elogios ou mimos a mais, têm nãos de menos, os adultos sendo quase sempre
capazes de dar os mimos e os elogios, muitas vezes mostram-se incapazes de dar
os nãos, de estabelecer os limites e as regras que, como sempre digo, são tão
necessárias às crianças como respirar e alimentar-se.
Esta dificuldade dos adultos em
oferecer os nãos aos miúdos, decorre muitas vezes de alguma desconforto
culpabilizante sentido com as circunstâncias e estilos de vida que inibem o
tempo e a disponibilidade que desejariam ter para os filhos. Ficando sem nãos,
muitas crianças, a coberto do afecto ou dos elogios dos pais, transformam-se em
pequenos ditadores que infernizam a vida de toda a gente, a começar por si
próprios.
Mas não têm mimos, afecto,
elogios a mais. Têm, repito, nãos a menos.
Por outro lado, também é muito
frequente falar dos comportamentos das crianças constatando que “não páram”,
são “agitadas”, “só gritam”, etc.
Por vezes digo que as crianças
gritam muito e agitam-se porque nós, por várias razões, ficamos mais surdos, só
quando gritam as ouvimos e só quando se agitam” reparamos nelas. E os miúdos
são inteligentes, percebem que assim é e agem em conformidade.
Neste contexto fomentar e ajudar
os pais a desenvolverem comportamentos de disponibilidade e escuta dos miúdos,
a assumirem com firmeza e sem culpa a necessidade de definir regras e limites,
de elogiar e mostrar afecto sem que se sintam a dar “mimos” a mais e que
“estragam” as crianças só pode ser um bom trabalho.
De pequenino é que se torce o
destino.
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