Na imprensa de hoje é divulgado
uma investigação realizada na Universidade de Coimbra que analisa a imprensa.
Assim, hoje a imprensa é notícia.
Dos dados divulgados releva um
retrato de precariedade, cerca de metade dos jornalistas inquiridos trabalha ao “abrigo” de
um contrato “próximo de lógicas de precariedade”, abundam salários baixos, mesmo
abaixo do salário mínimo, e é baixa a expectativa de carreira ou de mudança de natureza profissional.
Para além destes indicadores
parece de registar que 54,9% dos inquiridos refere que a sua situação laboral se
repercute no desempenho do seu trabalho e 28,9% considera que que tem impacto
na dimensão ética e deontológica do seu trabalho.
Ainda mais relevante é considerar que
35.7% dos jornalistas envolvidos se afirma objecto de pressões externas e cerca
de um quarto refere pressões das direcções e das administrações.
Como é evidente, os dados mais específicos
às questões profissionais, precariedade, carreira e salário são preocupantes e
afectam outros grupos profissionais.
No entanto, parecem-me
particularmente significativos os efeitos que estes dados possam ter no desempenho
da função de jornalista, tornando-a mais vulnerável, trata-se da sobrevivência,
as questões de qualidade e, como é referido, a constrangimentos em matéria de
ética e deontologia.
No mesmo sentido, a fragilidade
do jornalista enquanto profissional é também favorável à existência de pressões de
várias origens e com impacto potencial inquietante no papel que se espera que a
imprensa cumpra em sociedades abertas e democráticas.
Talvez, estes dados nos ajudem a
perceber aquilo que para quem acompanhe diariamente a imprensa portuguesa se torna
razoavelmente claro, a existência de agendas e critérios editoriais, uns mais
explícitos, outros mais dissimulados mas evidentes, que constroem narrativas em
que o jornalista mal pago, com um lugar precário e pressionado é apenas um peão
executivo.
Não é de agora, mas este quadro
agrava a natureza da relação dos poderes, designadamente do poder político, com
a comunicação social que tem algumas particularidades interessantes.
Se estivermos atentos, reparamos
como todos se procuram servir da comunicação social para a defesa dos seus
interesses pessoais, partidários, institucionais, económicos, etc. Nada de
novo, sabemos o peso que a comunicação social tem nas sociedades actuais e nos
últimos tempos também temos tido sucessivos episódios ilustrativos dessas
nebulosas relações.
Nesta matéria, para além das consequências
óbvias destes comportamentos, parece-me particularmente irritante a forma quase
infantil, está um pouco na moda este tipo de infeliz comparação mas não
resisto, como algumas figuras reagem ao ser abordadas pela imprensa sobre
assuntos sobre os quais, por várias razões, não lhes interessa discorrer.
Surgem então as afirmações patéticas, “não tenho nada a acrescentar”,
“desculpem, não comento”, “não estou aqui para falar dessas matérias,” “no
estrangeiro não comento questões nacionais”, etc., etc. Este pessoal desenvolve
assim uma espécie de surdez selectiva, só ouve o que lhe convém, de mutismo
selectivo, só fala do que lhe convém, de cognição selectiva, só conhece o que
lhe convém.
No entanto, são também estas as
figuras que directamente ou através de terceiros, lambem as botas às redacções
e aos jornalistas (quanto mais influentes melhor) e pedem, exigem, tempo de
antena quando tal serve os seus diferentes interesses.
Para combater este pântano seria
necessário uma imprensa forte, não proletarizada e precária que pudesse cumprir
a sua imprescindível função.
Sem comentários:
Enviar um comentário