"Crise "trava" divórcios em Portugal"
Parece estar a assistir-se em Portugal, dados do INE
reforçados com um estudo da Universidade Portucalense um abaixamento dos casos
de divórcio. Este abaixamento não parece decorrer de uma tendência positiva na
qualidade das relações conjugais mas à manutenção de uma relação dadas as
condições económicas e os custos de uma separação. Assim, cresce o número de
pessoas que apesar de separarem, continuam a partilhar a mesma casa por razões
económicas ou que nem sequer assumem a separação por insegurança sobre o
futuro. De facto, as famílias e as suas dinâmicas de constituição,
organização e funcionamento têm sido recorrentemente objecto de referência,
acentuando, sobretudo, os processos de mudança envolvidos.
No entanto, do meu ponto de vista, quase sempre me parece
que as diferentes abordagens não valorizam, por vezes nem referem, um aspecto
que me parece extraordinariamente relevante e que considero dos mais complexos
desafios sociais que actualmente enfrentamos, a educação familiar, ou seja, o
que é, o que deve ser, como deve ser a educação familiar em contextos altamente
diferenciados e em mudanças permanentes.
De facto, as enormes alterações que temos vindo a constatar
no universo das famílias implicam uma séria reflexão sobre as suas implicações
e impacto na educação familiar. O paradigma clássico, a família educativa e a
escola instrutiva, mudou substantivamente o que não significa, obviamente, a
alienação do papel educativo da família, mas sim atentar nas novas qualidades
que esse papel vai assumindo, parafraseando Camões.
Desde logo porque, por questões de logística e
funcionalidade, o tempo familiar para as crianças encolheu de forma dramática,
os miúdos passam tempos infindos na escola sob um princípio a que até o MEC se
lembrou de chamar de forma infeliz “Escola a tempo inteiro”. As famílias
expressam uma enorme dificuldade em compatibilizar o que ainda entendem ser o
seu papel educativo com a pressa e o pouco tempo que assumem ter para o
realizar. Tenho conhecido dezenas de pais que se sentem culpados e fragilizados
por entenderem que não têm a disponibilidade de tempo e atitude que julgam
necessária para os filhos. Esta culpa e fragilidade é, com frequência, a base
inconsciente que impede alguns pais de serem consistentes e firmes na definição
de regras e limites imprescindíveis às crianças, pois “temem estragar” o pouco
tempo que têm com elas devido a um eventual conflito.
Uma outra questão prende-se com o modo e a dificuldade que
muitos pais me referem sentir quando lidam com as crianças em situação de “duas
famílias”. Mais uma vez, as inseguranças e algum sentimento de culpa estão
presentes e contribuem para embaraços que levam os pais a pedir alguma ajuda.
Como sempre digo, é preferível uma boa separação a uma má família, mas alguns
pais sentem-se inseguros para construir cenários de educação familiar com
qualidade quando têm a guarda das crianças repartida.
A situação dos casais que apesar de separados continuam a
coabitar o mesmo espaço ou que nem sequer assumem a separação, criando uma
situação de "casados por fora" e "descasados por dentro",
poderá implicar, quando existem filhos, algumas ansiedades e inquietações nos
pais sobre a forma de lidar com um contexto em que aparentemente existe uma
família, quando na verdade já são duas com uma ou mais crianças entre elas.
A experiência mostra, como referi acima, que a educação
familiar se constitui como uma área extremamente complexa, não existem dois
contextos familiares iguais sendo que, para além de tudo, se trata de um
universo extremamente sensível a valores e convicções.
Assim sendo, importa estarmos atentos e procurar
disponibilizar apoios e orientações nas situações em que os pais revelam e
exprimem mais insegurança e dificuldades e que muitas vezes são fonte de grande
sofrimento para todos os envolvidos. Estas situações são bem mais frequentes e
graves do que julgamos.
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