O jovem que atacou colegas e uma funcionária da escola,
condenado a 30 meses de internamento em Centro Educativo, foi hoje libertado. A libertação, por
razões processuais, é temporária devendo retornar ao internamento onde tem
permanecido sob vigilância máxima devido a "risco de suicídio".
Algumas notas, de novo.
Aparentemente, este caso, com os dados conhecidos pela
imprensa, tem alguns contornos atípicos, trata-se de um bom aluno, miúdo
considerado inteligente, vivenciando uma situação de pouco acompanhamento e
alta pressão de uma família estruturada e funcional e outros aspectos mais
habitualmente presentes, vítima de colegas em situações de bullying e
dificuldades de relacionamento social com isolamento. Este quadro, aqui
abordado, naturalmente, em termos abstractos, pode promover um processo que
costumo designar por "incubação do mal" que se instala nos adolescentes,
a partir de situações de mal-estar que podem passar
relativamente despercebidas mas que, devagarinho, insidiosamente,
começam interiormente a ganhar um peso insuportável cuja descarga apenas
precisa de um gatilho, de uma oportunidade.
Ao olhar para a sentença e para a reacção do rapaz creio que
vale a pena recordar um estudo recentemente divulgado, o Programa de
Avaliação e Intervenção Psicoterapêutica no Âmbito da Justiça Juvenil,
promovido pela DGRSP e co-financiado pela Comissão Europeia, revelando que a
média etária dos rapazes dos centros é de 16,6 anos. Em geral, acumulam mais de
três anos de chumbos na escola, e, em 80% dos casos, são de famílias cujo
estatuto socioeconómico é baixo. Este perfil não corresponde ao do jovem hoje
sentenciado. Mas é relevante que mais de 90% dos que foram entrevistados têm
pelo menos uma pertubação psiquiátrica, “o que é um dado
astronómico”, como classificou Daniel Rijo, professor da Universidade de
Coimbra, um dos autores do trabalho para a DGRSP. Nem todos têm o
acompanhamento que seria necessário, admitiu.
Por outro lado, segundo dados da Direcção-Geral de Reinserção
e Serviços Prisionais, 24% dos jovens de alto risco de envolvimento em
comportamentos de delinquência e a quem foram aplicadas medidas
tutelares incluindo o internamento em Centros Educativos reincidiram nos
primeiros 12 meses e ao fim de 26 meses a taxa de reincidência sobe para 48.6%.
Julgo importante ainda recordar dados divulgados em 2012 que
sublinharam o aumento da delinquência urbana, sendo que 86% dos incidentes
registados são protagonizados por gente jovem, dos 16 aos 35 anos.
Sempre que estas matérias são discutidas, os especialistas
acentuam a importância da prevenção e da integração comunitária como eixos
centrais na resposta a este problema sério das sociedades actuais.
Parece ser cada vez mais consensual que mobilizar quase que
exclusivamente dispositivos de punição, designadamente a
prisão, parece insuficiente para travar este problema e, sobretudo, inflectir
as trajectórias de marginalização de muitos dos envolvidos mais novos em
episódios de delinquência.
No entanto a discussão sobre estas matérias é inquinada por
discursos e posições frequentemente de natureza demagógica e populista
alimentados por narrativas sobre a insegurança e delinquência percebida,
alimentadora de teses securitárias.
A questão central, insisto, é que, sobretudo
no caso de gente mais nova, a prisão não pode ser a única solução, os dados
sobre a elevadíssima taxa de reincidência mostram isso mesmo. Apesar de,
repito, a punição e a detenção constituírem um importante sinal de combate à
sensação de impunidade instalada, é minha forte convicção de que só punir e
prender não basta.
Parece ser cada vez mais consensual que mobilizar quase que
exclusivamente dispositivos de punição, designadamente a prisão, parece
insuficiente para travar este problema e, sobretudo, inflectir as trajectórias
de marginalização de muitos dos envolvidos mais novos em episódios de
delinquência.
Talvez todo este quadro deveria a ser considerando na
análise deste episódio de que hoje se conheceu a sentença mas que,
provavelmente, não acaba aqui.
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