Terminou hoje o julgamento do
menor que atacou com uma faca colegas e uma funcionária da escola que frequentava.
Foi condenado a dois anos e meio de internamento em regime fechado. O Centro
Educativo em que tem estado terá informado os pais de que depois de ser
conhecida a sentença, o rapaz entrou numa "crise aguda de depressão"
e está sob vigilância máxima devido a "risco de suicídio". Algumas
notas, de novo.
Aparentemente, este caso, com os
dados conhecidos pela imprensa, tem alguns contornos atípicos, trata-se de um
bom aluno, miúdo considerado inteligente, vivenciando uma situação de pouco
acompanhamento e alta pressão de uma família estruturada e funcional e outros
aspectos mais habitualmente presentes, vítima de colegas em situações de bullying
e dificuldades de relacionamento social com isolamento. Este quadro, aqui
abordado, naturalmente, em termos abstractos, pode promover um processo que
costumo designar por "incubação do mal" que se instala nos
adolescentes, a partir de situações de mal-estar que podem passar
relativamente despercebidas mas que, devagarinho, insidiosamente,
começam interiormente a ganhar um peso insuportável cuja descarga apenas
precisa de um gatilho, de uma oportunidade.
Ao olhar para a sentença e para a
reacção do rapaz creio que vale a pena recordar um estudo recentemente
divulgado, o Programa de Avaliação e Intervenção Psicoterapêutica no
Âmbito da Justiça Juvenil, promovido pela DGRSP e co-financiado pela Comissão
Europeia, revelando que a média etária dos rapazes dos centros é de 16,6 anos.
Em geral, acumulam mais de três anos de chumbos na escola, e, em 80% dos casos,
são de famílias cujo estatuto socioeconómico é baixo. Este perfil não
corresponde ao do jovem hoje sentenciado. Mas é relevante que mais de 90% dos
que foram entrevistados têm pelo menos uma perturbação psiquiátrica, “o que é
um dado astronómico”, como classificou Daniel Rijo, professor da Universidade
de Coimbra, um dos autores do trabalho para a DGRSP. Nem todos têm o
acompanhamento que seria necessário, admitiu.
Por outro lado, segundo dados da
Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, 24% dos jovens de alto
risco de envolvimento em comportamentos de delinquência e a quem
foram aplicadas medidas tutelares incluindo o internamento em Centros
Educativos reincidiram nos primeiros 12 meses e ao fim de 26 meses a taxa de
reincidência sobe para 48.6%.
Julgo importante ainda recordar
dados divulgados em 2012 que sublinharam o aumento da delinquência urbana,
sendo que 86% dos incidentes registados são protagonizados por gente
jovem, dos 16 aos 35 anos.
Sempre que estas matérias são
discutidas, os especialistas acentuam a importância da prevenção e da
integração comunitária como eixos centrais na resposta a este problema sério
das sociedades actuais.
Parece ser cada vez mais
consensual que mobilizar quase que exclusivamente dispositivos de punição,
designadamente a prisão, parece insuficiente para travar este problema e,
sobretudo, inflectir as trajectórias de marginalização de muitos dos envolvidos
mais novos em episódios de delinquência.
No entanto a discussão sobre
estas matérias é inquinada por discursos e posições frequentemente de natureza
demagógica e populista alimentados por narrativas sobre a insegurança e
delinquência percebida, alimentadora de teses securitárias.
A questão central, do meu ponto
de vista, é que, sobretudo no caso de gente mais nova, a prisão não pode ser a
única solução, os dados sobre a elevadíssima taxa de reincidência mostram isso
mesmo. Apesar de, repito, a punição e a detenção constituírem um importante
sinal de combate à sensação de impunidade instalada, é minha forte convicção de
que só punir e prender não basta.
Parece ser cada vez mais consensual que mobilizar quase que exclusivamente dispositivos de punição, designadamente a prisão, parece insuficiente para travar este problema e, sobretudo, inflectir as trajectórias de marginalização de muitos dos envolvidos mais novos em episódios de delinquência.
Talvez todo este quadro deveria a
ser considerando na análise deste episódio de que hoje se conheceu a sentença
mas que, provavelmente, não acaba aqui.
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