Um trabalho da responsabilidade
da Universidade do Porto envolvendo um grupo populacional significativo, cerca
de 3000 jovens nascidos em 1990, mostra alguns dados interessantes.
Um primeiro aspecto a sublinhar é
o salto muito significativo do nível de escolaridade atingido por estes jovens,
três vezes o da escolaridade média dos seus pais. Se por um lado este indicador atesta o trabalho
desenvolvido no sistema educativo nos últimos anos e já emergente nos
resultados obtidos nos estudos comparativos internacionais, que, do meu ponto
de vista podem ser ameaçados por alguns aspectos da actual política educativa,
importa registar que, tal como a OCDE há dias divulgava, ainda existe uma muito
forte relação entre a qualificação escolar dos pais e a qualificação dos alunos
melhor sucedidos, isto é, a formação mais avançada é tendencialmente conseguida
por jovens cujos pais são também mais qualificados e que o nível médio dos pais
é muito baixo pelo que a diferença para os filhos assume maior expressão.
Um outro dado prende-se com os
consumos, álcool e tabaco, comportamentos de risco, na condução por exemplo, e
violência nas relações interpessoais de namoro. Constata-se que a subida do
nível de escolarização não parece suportar mudanças significativas nos
comportamentos. Por razões de espaço, algumas notas apenas dirigidas para este último
aspecto, menos abordado de um forma geral, a violência nas relações pessoais
mais íntimas.
No âmbito das relações de namoro,
60% dos jovens inquiridos relataram pelos menos um caso de agressão psicológica, insultar
por exemplo. Um em cada três jovens também refere pelo menos um
episódio de coacção sexual e 18 % referiram pelo menos um acto de violência
física, bater ou arremessar um objecto com o objectivo de atingir o outro. É
ainda de registar que mais de metade dos jovens envolvidos assumem o estatuto
de vítimas mas também de agressores.
Estes números que são coerentes
com outros estudos sobre comportamentos de violência nas relações amorosas
indiciam o que está por fazer em matéria de valores e comportamentos sociais.
Recordo um trabalho interessante de
há alguns meses divulgado UMAR - União de Mulheres Alternativa e Resposta, um
estudo envolvendo 885 pessoas com idades entre os 11 e os 18 a frequentar
escolas da área do Porto e de Braga. Em síntese, para mais de metade dos
inquiridos neste estudo será normal proibir ao namorado(a) o uso de
determinadas roupas, 5% dos rapazes acham que agredir a namorada não é
violência. 25 % dos rapazes e 13,3% das raparigas acham que humilhar o
parceiro(a) é legítimo e 15,65 dos rapazes e 5% das raparigas entendem que
ameaçar é um comportamento normal.
Este conjunto de dados é
preocupante mas creio que não é surpreendente. Os dados sobre violência
doméstica em adultos deixam perceber a existência de um trajecto pessoal
anterior que suporta os dados destes e de outros trabalhos.
Os sistemas de valores pessoais
alteram-se a um ritmo bem mais lento que os nossos desejos e estão, também e
obviamente, ligados ao quadro de valores sociais presentes em cada época. De
facto, e reportando-nos apenas aos dados mais gerais, é relevante a percentagem
de jovens que afirmam um entendimento de normalidade face a diferentes
comportamentos que evidentemente significam relações de abuso e maus tratos.
Como todos os comportamentos
fortemente ligados à camada mais funda do nosso sistema de valores, crenças e
convicções, os nossos padrões sobre o que devem ser as relações interpessoais,
mesmo as de natureza mais íntima, são de mudança demorada. Esta circunstância,
torna ainda mais necessária a existência de dispositivos ao nível da formação e
educação de crianças e jovens; de uma abordagem séria persistente nos meios de
comunicação social; de um enquadramento jurídico dos comportamentos e limites
numa perspectiva preventiva e punitiva e, finalmente, de dispositivos eficazes
de protecção e apoio a eventuais vítimas.
Entretanto e enquanto não,
"só faço isto, porque gosto de ti, acreditas não acreditas?"
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