No I de ontem está uma peça sobre uma matéria a que aqui me
tenho referido que, do meu ponto de vista, continua a merecer uma atenção
contínua, o mal-estar de muitos adultos e crianças em consequência de processos
de separação conflituosos.
Dados do Relatório Estatísticas da Justiça de
Família e Menores referidos pela Associação Portuguesa para a
Igualdade Parental e Direito dos Filhos, referem que em 2012 se registaram mais
de 17 mil novos processos de regulação parental e 22 mil por
incumprimento, um aumento substancial face a anos anteriores. Estas situações
que podem implicar várias presenças em Tribunal demoram em média cerca de 30
meses a decidir. Em situações mais difíceis, casos de alienação parental total
por exemplo, as crianças podem estar todo este tempo sem contacto com pai ou
mãe. No entanto, existem ainda situações extremas em que um processo pode durar
oito anos.
Importa referir que está estabelecido que a decisão de
regulação não deve ultrapassar um mês pelo que o cenário é deveras preocupante.
A Associação refere que existem falhas significativas quer
por parte do sistema de justiça, quer por parte do Instituto de Segurança
Social legalmente envolvido nos casos de regulação parental.
Em Janeiro de 2013 noticiava-se que o Instituto tinha 154
técnicos para este volume de cerca de 39 000 casos sendo que esses técnicos
acumulam ainda outras funções, por exemplo, nas Comissões de Protecção de
Crianças e Jovens.
Temos assim definida uma situação absolutamente deplorável
com previsíveis consequências negativas sérias para as crianças, mas
também, naturalmente para os adultos que, apesar da separação, não perdem a
condição de pais e desejam vê-la regulada. Este facto assume especial
relevância em casos de maior litígio ou até na controversa situação designada
por alienação parental.
O princípio fundador do nosso quadro normativo, o Superior
Interesse da Criança, tantas vezes lembrado e tantas vezes esquecido, exigiria,
obviamente, que esta situação fosse minimizada com urgência.
Os estudos na área da sociologia familiar têm vindo a
evidenciar um aumento do número de divórcios que parece ligado, entre outras
razões, a alterações na percepção social da separação, menos “punitiva” e
“culpabilizante” para os envolvidos. Estará a criar-se assim uma situação mais
favorável, até do ponto de vista legal, à facilidade do processo de divórcio o
que poderá levar a decisões, cuja bondade não avalio, que podem ser apressadas,
por decisão não assumida por ambos e não antecipando a necessidade de minimizar
eventuais impactos, sobretudo quando existem filhos.
Neste quadro, podem emergir nos adultos, ou num deles,
situações de sofrimento, dor e/ou raiva, que “exigem” reparação e ajuda. Muitos
pais lidam sós com estes sentimentos pelo que os filhos surgem frequentemente
como o “tudo o que ficou” ou o que “não posso, não quero e tenho medo de também
perder”. Poderemos assistir então a comportamentos de diabolização da figura do
outro progenitor, manipulação das crianças tentando comprá-las (o seu afecto),
ou, mais pesado, a utilização dos filhos como forma de agredir o outro o que
torna necessária a intervenção reguladora de estruturas ou serviços que se
deseja oportuna no tempo e eficaz na ajuda. Este tipo de situações está
ilustrado na peça do I e em alguns casos pode atingir limites sem retorno como
temos vindo a assistir com alguma regularidade.
É obviamente imprescindível proteger o bem-estar das
crianças mas não devemos esquecer que, em muitos casos, existem também adultos
em enorme sofrimento e que a sua eventual condenação, sem mais, não será
seguramente a melhor forma de os ajudar. Ajudando-os, os miúdos serão ajudados.
Quero ainda sublinhar que, por princípio, prefiro uma boa separação a uma má
família.
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