domingo, 18 de março de 2012

OS CONSUMOS, DROGA DE VIDA

No Público de hoje está um trabalho extenso e muito interessante sobre a sempre actual questão da relação entre droga, adolescência e juventude. De todo o trabalho que merece leitura atenta, gostava de salientar dois aspectos, a inversão do abaixamento do consumo que vinha a verificar-se até 2010, agora está a subir, e o facto de quase ter duplicado a venda de droga na escola ou à volta da escola. Segundo os técnicos, o volume traficado poderá ser superior ao que se verifica nos contextos das discotecas.
É também de registar a aparente "normalidade" com que para muitos adolescentes é encarado o consumo e tráfico, embora se afirmem conscientes dos riscos. Pais e professores ouvidos evidenciam um discurso que varia entre o desconhecimento e a impotência resignada.
Deste quadro, releva uma questão que assume múltiplas dimensões que alguma vezes tenho abordado no Atenta Inquietude, o papel, a função, os limites da escola.
Nas últimas décadas, sobretudo devido às alterações dos estilos de vida, os miúdos têm vindo a passar cada vez mais tempo diário na escola e mais anos na escola. No que respeita ao tempo diário, a duração da estadia diária de algumas crianças e adolescentes na escola está francamente acima do desejável correndo-se o risco da intoxicação, "overdose" de que se começam a ver alguns efeitos.
Neste cenário e como é previsível, estando a vida dos miúdos tão ligada à escola, os problemas que os afectam, todos os problemas, acabam por se reflectir na escola, é lá que estão a maior parte do tempo. Percebe-se assim porque se aproxima da escola o tráfico e consumo de drogas, sobretudo as mais leves como o haxixe mas envolvendo outras substância.
Acontece então que a escola fica confrontada com múltiplos problemas que, verificando-se na escola, são de difícil solução por parte da escola, ou seja, a escola pode, e deve, fazer parte da solução mas não pode ser a solução.
O caso dos consumos é um bom exemplo, solicita a intervenção dos serviços vocacionados, em contenção de recursos e meios devido à "austeridade", envolve as forças de segurança (existe o crime de tráfico), solicita o envolvimento dos pais e, naturalmente solicita uma atenção ou intervenção por parte da escola que não é fácil. Solicita, por exemplo, formação, solicita recursos técnicos que possam mediar o contacto entre jovens e famílias (não exclusivamente nos casos de consumo e tráfico), solicita um papel muito mais activo dos directores de turma que, do meu ponto de vista deveriam ter mais tempo para trabalhar com os seus alunos e menos carga burocrática, etc.
Uma nota final para a questão das famílias. Em alguns casos de consumo (e não só de drogas) pode haver alguma negligência paternal mas, na maioria dos casos, trata-se de pais, que sabem o que se passa, “apenas fingem” não perceber, desejando que o tempo “cure” porque se sentem tremendamente assustados, sem saber muito bem o que fazer e como lidar com a questão. De fora parece fácil produzir discursos sobre soluções, mas para os pais que estão “por dentro” a situação é muitas vezes sentida como maior que eles, justificando-se a criação de programas destinados a pais e aos adolescentes que minimizem o risco do consumo excessivo.
Existem áreas de problemas que afectam as comunidades em que os custos da intervenção são claramente sustentados pelas consequências da não intervenção, ou seja, não intervir ou intervir mal é sempre bastante mais caro que a intervenção correcta em tempo oportuno. Os consumos, droga e álcool, são exemplos dessas áreas.

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