O MEC, à luz do incremento de autonomia das escolas, permite que estas possam organizar de forma flexível a duração dos tempos lectivos desde que cumpram as cargas horárias estipuladas para as diferentes disciplinas. Esta disposição parece-me de sublinhar pela positiva.
Sob o mesmo princípio, a autonomia, as escolas poderão organizar as turmas de modo a "prover a homogeneidade das aprendizagens". Esta ideia traduz-se na possibilidade de constituir grupos diferentes de alunos com mais dificuldades e, simultaneamente, ficar com grupos de alunos melhores que mais progredirão. O MEC afirma, no entanto, que esta será uma situação transitória e não um critério de constituição de turmas. Talvez fosse mais sério e correcto, em vez de referir a "homogeneidade das aprendizagens" referir a "homogeneidade dos grupos", maus com maus e bons com bons. Esta medida já existiu em tempos com as turmas de nível e quem conhece a realidade sabe que os resultados dos alunos "maus" continuaram genericamente maus, o povo diz junta-te aos bons e será como eles, junta-te aos maus e serás pior do que eles.
Quem lida com miúdos reconhece que, na verdade, não existem grupos homogéneos e não vislumbro o que seja a "homogeneidade das aprendizagens", quem tanto combateu o "eduquês" talvez agora pense e fale em "cratês", terei que estudar mais para perceber.
A constituição de grupos nivelados, "homogéneos", com base no rendimento escolar, no comportamento ou na origem social e familiar, não é rara nas nossas escolas, é do conhecimento da tutela que tolera o procedimento, as escolas já têm autonomia nesta matéria. Sabemos todos de turmas maioritariamente constituídas por repetentes ou oriundos de alguns bairros, bem como, pelo contrário, turmas maioritariamente constituídas por bons alunos, filhos de docentes ou de funcionários ou de alguém com “capacidade” para influenciar a definição da turma para o seu filho. Até sabemos de escola públicas que recusam alunos com base no "currículo que carregam. Nada de novo, portanto.
A questão central coloca-se em dois patamares, a eficácia e o impacto nos alunos. Vamos por partes. A experiência e os estudos realizados sobre estas questões mostram que se os “bons” continuam bons os “maus” também continuam maus, apenas deixam, crê-se, de atrapalhar o trabalho dos bons. O trabalho dos maus, sendo nivelado por baixo introduz um tecto nas aprendizagens que inibe um percurso do mesmo tipo e qualidade que o dos bons mesmo que sejam bem sucedidos, o que não acontece na maioria dos casos. Nós aprendemos mais e melhor com quem sabe mais que nós.
Quanto ao impacto, parece óbvio que a diversidade é sempre preferível a uma falsa homogeneidade. As atitudes de discriminação negativa não apresentam nenhuma espécie de vantagem pessoal ou social, guetizam, estigmatizam e promovem quer nos bons, quer nos maus, uma relação desconfiada e tensa facilitadora de problemas.
As dificuldades escolares gerem-se com apoios e recursos que terão certamente de ser diferenciados mas não podem, não devem, implicar a criação de reservas para os “maus”.
Finalmente, creio que esta medida, grupos de nível, se inscreve num processo de selecção neodarwinista que o MEC tem vindo de mansinho a instalar. Só mais dois exemplos recentes, alunos em idade de escolaridade obrigatória podem ser expulsos da escola por infracção disciplinar e os alunos com "limitações cognitivas" fazem os mesmos exames que os seus colegas. O caminho é este, dos fracos não reza a história.
O problema é que se não for a escola, a educação, a promover equidade de oportunidades e a combater a exclusão não restará nada nem ninguém que o faça. O Ministro da Educação e Ciência deveria saber isto.
3 comentários:
Concordo completamente, estamos a legitimar a exclusão. Mas é excusado denegrir a selecção neodarwinista.
Não há nada de Darwin nesta triste medida. Muito gostam certos lobbys privilegiados de usar "darwin" seguido de qualquer "ismo" para justificar exclusão social dos seus círculos.
Que eu saiba, a evolução segundo Darwin prevê um ambiente onde todos os organismos interagem em conjunto, ao mesmo tempo, e que segundo o meio, determinadas características seriam mais ou menos propicias em determinada altura. Segundo Darwin, qualquer tipo de uniformidade de características levaria inevitavelmente à extinção da espécie.
Teremos que por os "bons" alunos em zoos.
Caro anónimo, aceito as suas considerações sobre a minha refererência simplista a Darwin, mas não faço parte de nenhum "lobby privilegiado". Apenas sei por experiência como esta medida promove exclusão
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