Não pode deixar de ser, é dia 25 de Abril.
Não é raro que a propósito de diferentes matérias ainda se oiçam formulações como "afinal o 25 de Abril ...", e ... "estamos como estamos".
Não é raro que a propósito de diferentes matérias ainda se oiçam formulações como "afinal o 25 de Abril ...", e ... "estamos como estamos".
Devo dizer que não simpatizo com
este tipo de afirmações. Sendo certo que temos vivido tempos difíceis também é
verdade que não é sequer possível comparar o país de hoje com o país de 1973. Já
passaram 43 anos, para refrescar algumas memórias ou contar alguma história aos
mais novos, deixem que vos fale um pouco da escola do meu tempo, o tempo dos
anos cinquenta e sessenta. Escolho falar da escola porque é um universo que
conheço um pouco melhor, mas poderia fazer o mesmo exercício em muitas outras
áreas de funcionamento da nossa sociedade.
Não me esqueço, antes pelo
contrário, que a nossa educação, a escola, como tudo o resto, também tem
atravessado dificuldades e problemas sérios mas só a falta de memória, uma
qualquer agenda ou o desconhecimento sustentam o “antigamente era melhor”.
Vejamos, pois, um pouco da escola do meu tempo, conversa de velho, já se vê.
A escola que havia lá para trás
no tempo não era grande, nem pequena, era triste. A maioria das pessoas que por
lá andavam era, naturalmente, triste.
As pessoas que mandavam na escola
estabeleciam o que toda a gente tinha de aprender, fazer, dizer e pensar. Quem
pensasse, dissesse ou fizesse diferente podia até sofrer algum castigo, mesmo
os professores, não eram só os alunos. Não se podia inventar histórias, as
pessoas contavam só histórias já inventadas. Às vezes, os miúdos e os
professores, às escondidas, inventavam histórias novas.
Eu andei nesta escola lá para
trás no tempo.
E na escola do meu tempo nem
todos lá entravam e muitos dos que o conseguiam saíam ao fim de pouco tempo,
ficando com a segunda ou terceira classe, como então se chamava. Chegava. Alguns outros, nem se entendia que deveriam estar na escola, eram deficientes.
E na escola do meu tempo os
rapazes estavam separados das raparigas.
E na escola do meu tempo havia um
só livro e toda a gente aprendia apenas o que aquele livro trazia.
E na escola do meu tempo levavam-se
muitas reguadas, basicamente por dois motivos, por tudo e por nada.
E na escola do meu tempo
ensinavam-nos a ser pequeninos, acríticos e a não discutir, o que quer que
fosse.
E na escola do meu tempo eu era
“obrigado” a ter catequese, religiosa e política.
E na escola do meu tempo
aprendia-se que os homens trabalham fora de casa e as mulheres cuidam do lar e
dos filhos.
E na escola do meu tempo não
aprender não era um problema, quem não “tinha jeito para a escola, ia para o
campo”.
E na escola do meu tempo não se
falava do lado de fora de Portugal. Do lado de dentro só se falava do Portugal
cinzento e pequenino. Na escola do meu tempo eu era avisado em casa para não
falar de certas coisas na escola, era perigoso.
Quem mandava no país achava que
muita escola não fazia bem às pessoas, só a algumas. Ao meu pai perguntaram
porque me tinha posto a estudar depois da quarta classe, não era frequente
naquele meio, para ser serralheiro como ele não precisava de estudar mais.
Sim, eu sei, não precisam de me
dizer que a escola deste tempo tem muitas coisas, embora com outras vestes e
discursos, que nos recordam a escola do meu tempo. Mas o caminho é melhorar a escola deste tempo
não é, não pode ser, querer a escola do meu tempo.
Eu andei naquela escola lá para
trás no tempo.
Por isso, quando falam da escola
hoje, penso, nunca mais voltarei a andar naquela escola. E não quero que o meu
neto e os outros miúdos andem numa escola como aquela, a minha escola, lá para
trás no tempo.
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