sábado, 22 de abril de 2017

MENORES EM RISCO, FUTURO EM RISCO

O DN divulga alguns dados preliminares do relatório anual relativo a 2016 da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Protecção das Crianças e Jovens.
Em média, sete crianças por dia, 2719 situações sinalizadas de maus tratos físicos e psicológicos a crianças às comissões de menores.
Apesar de um abaixamento ligeiro do número de situações face a 2015 os episódios conhecidos parecem mais grave, designadamente caso de agressão física recorrendo a a materiais como cabos eléctricos, pneus, chicotes ou colheres de metal. Verificaram-se 360 casos de espancamento grave a crianças dos 0 aos 5 anos, 523 dos 6 aos 10 anos, 541 casos dos 11 aos 14 e 442 dos 15 aos 18 anos.
Estima-se que em Portugal cerca de 12 000 crianças estejam expostas a situações que as marcam negativamente, violência doméstica, o que constitui, aliás, a maior justificação para sinalização às CPCJ, cerca de 30%
Deve ainda considerar-se que nem todos os casos chegam às Comissões de Protecção o que torna o cenário ainda mais preocupante sendo que na sua esmagadora maioria são detectados nas escolas e nos serviços de saúde.
Embora não possa ser estabelecida de forma ligeira nenhuma relação de causa efeito, as dificuldades severas que muitas famílias têm atravessado e a insuficiência de apoios sociais não serão alheias a muitas das situações de risco em que crianças e jovens estão envolvidos pois os estudos mostram que crianças e velhos constituem justamente os grupos mais vulneráveis.
De há muito e a propósito de várias questões, que afirmo que em Portugal, apesar de existirem vários dispositivos de apoio e protecção às crianças e jovens e de existir legislação no mesmo sentido, sempre assente no incontornável “superior interesse da criança", não possuímos ainda o que me parece mais importante, uma cultura sólida de protecção das crianças e jovens de que temos exemplos com regularidade.
Por outro lado, as condições de funcionamento as Comissões de Protecção de Crianças e Jovens que procuram fazer um trabalho eficaz estão ainda longe de ser as mais eficazes e operam em circunstâncias difíceis. Na sua grande maioria as Comissões têm responsabilidades sobre um número de situações de risco ou comprovadas que transcendem a sua capacidade de resposta. A parte mais operacional das Comissões, a designada Comissão restrita, tem muitos técnicos a tempo parcial. Tal dificuldade repercute-se, como é óbvio, na eficácia e qualidade do trabalho desenvolvido, independentemente do esforço e empenho dos profissionais que as integram.
Este cenário permite que ocorram situações, frequentemente com contornos dramáticos, envolvendo crianças e jovens que, sendo conhecida a sua condição de vulnerabilidade não tinham, ou não tiveram, o apoio e os procedimentos necessários. Ainda acontece que depois de alguns episódios mais graves se oiça uma expressão que me deixa particularmente incomodado, a criança estava “sinalizada” ou “referenciada” o que foi insuficiente para a adequada intervenção. Em Portugal sinalizamos e referenciamos com relativa facilidade, a grande dificuldade é minimizar ou resolver ou minimizar os problemas das crianças referenciadas ou sinalizadas.
Por isso, sendo importante registar uma aparente menor tolerância da comunidade aos maus tratos aos miúdos, também será fundamental que desenvolva a sua intolerância face à ausência de respostas.

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