A partir dos dados
disponibilizados pela Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência o
Público titula que “Número de alunos com necessidades educativas especiais voltou a aumentar”.
Em síntese e relativamente a
2015/2016 o aumento foi de 5%, de 78 175 para 82667. O maior aumento, 18%,
verifica-se no secundário, também aumenta no 3º ciclo, 8%, onde se regista
aliás o maior número alunos com esta “avaliação” e baixou 3% no1º ciclo e
educação pré-escolar.
O aumento do número de situações “diagnosticadas”
no secundário pode estar ainda associado à extensão da escolaridade obrigatória
“obrigando” a que continuem em processo de escolaridade.
O aumento de “diagnósticos” está
em linha com o que se tem verificado nos últimos anos mas deve ser encarado com
prudência.
A demografia discente em baixa
apesar da situação particular do secundário e a ausência de estudos que o
sustentem não permite afirmar que a “incidência” de “necessidades educativas
especiais” esta a aumentar.
Como a propósito de dados de anos
anteriores já tive oportunidade comentar incluindo através de um texto no
Público, esta conclusão, “aumento do número de alunos com NEE” deve ser
produzida e interpretada com alguma prudência pois creio que podem
estabelecer-se alguns equívocos.
O que sucessivos relatórios vão
mostrando é que aumenta o número de alunos destinatários de dispositivos de
apoio educativo o que na verdade não significa que tenham NEE e, por outro
lado, em anos anteriores e por razões já muitas vezes abordadas existiam alunos
com dificuldades e sem qualquer apoio, ou seja em anos anteriores não tínhamos
menos alunos com NEE mas sim menos alunos apoiados em consequência das
políticas educativas o que não é a mesma coisa.
Concretizando, o nível de aumento
que segundo a DGEEC se verificou entre 2010/2011 e 2014/2015, 73.5% (!!) e o
que se tem verificado posteriormente como os dados de hoje comprovam não pode,
evidentemente, significar o aumento de casos de NEE mas sim de alunos apoiados
com a justificação de que apresentam NEE. Vejamos porquê.
De facto, por efeito de filtros
de uma natureza discutível na disponibilização de apoios e recursos a alunos
que evidenciam dificuldades, o número de alunos com apoio educativo era muito
menor do que o número de alunos que dele necessitavam e das estimativas de
necessidades com base em critérios internacionalmente aceites. Esta recorrente
situação tem sido objecto de análise quer pela Inspecção-Geral de Educação,
quer pelo Conselho Nacional de Educação
Neste cenário, por pressão dos
professores e pais confrontados com muitos alunos a necessitar de ajuda começou
a verificar-se progressivamente que, mesmo com os normativos desfavoráveis que
filtravam o acesso a apoios, as escolas foram tentando com os recursos
disponíveis providenciar algum tipo de ajuda o que contribui para esta subida
fortíssima de alunos com NEE em apoio nas escolas portuguesas.
No entanto, este aumento não
significa, não conheço estudos que o suportem, uma alteração com o mesmo grau
de significado no padrão e quadros de necessidades dos alunos no que se refere,
sublinho, a situações de NEE apesar da confusa e pouco sólida definição e
conceitos que os normativos utilizam. A estranha diferença entre o carácter
permanente ou “transitório(!)” das NEE que um aluno possa evidenciar é apenas
um exemplo.
Por outro lado, um sistema
educativo que se tornou altamente “normalizado” (currículos extensos,
prescritivos, assentes em centenas de metas curriculares por disciplinas),
competitivo, selectivo (“darwinista”), assente em filtros sucessivos, os
exames, os rankings, os incentivos às escolas com sobrevalorização da avaliação
externa dos alunos, etc. acaba, necessariamente, por se tornar incapaz de
acomodar as diferenças entre os alunos, nem sequer estou a falar de NEE, e
induz um aumento do número de alunos que podem sentir dificuldade em acompanhar
o “ritmo” do trabalho. Se bem repararmos, este cenário é compatível com o
aumento no 3º ciclo e secundário e também com o decréscimo agora verificado no
1º ciclo e educação pré-escolar devido a alterações recentes.
Mais uma vez, por inexistência de
recursos de outra natureza, muitas escolas providenciam alguns apoios a esta
franja de alunos através dos dispositivos de educação especial o que também
contribui para o aumento do número de alunos apoiados considerados como
apresentando NEE.
Tudo isto considerado surge o que
considero a questão central, que apoios e recursos estão a ser disponibilizados
a alunos, professores e pais? Serão suficientes, quer em docentes (apesar do
aumento verificado), técnicos (por exemplo psicólogos com base num rácio aceitável) ou assistentes
operacionais? Serão adequados? Contribuem para o sucesso real dos alunos
considerando todas as suas capacidades e competências? São informadas por
princípios de educação inclusiva cujo critério fundamental é a participação,
tanto quanto possível, nas actividades comuns das comunidades escolares?
Gostava de ser mais optimista até
porque estão em preparação alterações nesta matéria a verdade é que apesar do
esforço notável da generalidade das direcções escolares, dos professores,
técnicos e assistentes, da existência de práticas e experiências de excelente
nível, a realidade está aquém do que seria desejável.
Assim, a inquietação de
professores e pais é como responder de forma adequada e exigente, sim devemos
ser exigentes, às necessidades e dificuldades educativas ou escolares de todos
os alunos que em qualquer circunstância as possam evidenciar, independentemente
da sua natureza. Aliás, a necessidade de uma avaliação educativa sólida e
competente das reais necessidades ou dificuldades é o primeiro passo para uma
resposta adequada.
3 comentários:
Inteiramente de acordo consigo. A última frase do seu texto diz tudo.
Abraço
Teresa
Concordo com a análise e, sobretudo, com o último parágrafo. No entanto, se existe um aumento de alunos considerados com necessidades educativas especiais, para além de qualquer especulação, deve-se aferir se, de facto, são "verdadeiros" alunos com necessidades educativas especiais. Essa tarefa pode ser (já deveria ter sido!) atribuída à Inspeção-Geral da Educação e Ciência e ou aos supostos técnicos responsáveis pela área da educação especial que se encontram nas estruturas regionais de educação. É lamentável que nas reuniões, numa atitude de forte suspeição e responsabilização, confrontem os agrupamentos de escolas com o "crescente aumento de alunos com necessidades educativas especiais" mas, na prática, e quando convidados, não se dignem deslocar-se às escolas e analisar todos os processos dos alunos, verificando se, de facto, são, ou não, alunos que evidenciam necessidades educativas especiais de caráter permanente. Vivemos um pouco num clima de suspeição da prestação das escolas mas também não se vislumbra qualquer interesse, por parte da tutela, nacional e regional, em aferir da verdadeira situação.
Olá João Adelino. Concordo com o que diz, a minha questão não tem a ver com a responsabilização das escolas por esta situação, antes pelo contrário. Um DL 3/2008 que instituiu um inaceitável escrutínio de "elegibilidade" em educação é que sustenta toda esta situação. As escolas quando estão menos pressionadas pelas comissões de monitorização e porque percebem que têm alunos com algum tipo de dificuldade que precisa de apoio recorrem ao "rótulo" para os poderem ajudar. Eu percebo isto. A questão é concluir que o número de alunos com NEE está a aumentar quando o que aumenta é o número de alunos "CONSIDERADOS" com NEE o que não é a mesma coisa. Abraço
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