Em França está em discussão uma proposta no sentido de
abandonar avaliações escolares de natureza quantitativa, as notas.
Segundo o DN, também em Portugal a reflexão sobre esta
questão entrará na agenda dado que o Conselho Nacional de Educação promove um
debate sobre a matéria. Parece-me importante a abertura deste debate pois sou
dos que entende que “medir muitas vezes a febre não a faz baixar”.
O Presidente do CNE sustenta que no ensino básico a avaliação
quantitativa apensa deveria ocorrer nos anos com exame nacional 4º, 6. E 9º
sendo nos restantes usados exclusivamente dispositivos de avaliação formativa.
No entanto, parece claro que abolir as avaliações
quantitativas iria no sentido oposto ao que em matéria de avaliação informa a
actual política educativa que, na verdade, se transformou numa espécie de
examocracia, assente na convicção de que a medida sucessiva é base da qualidade
e que se tem vindo a traduzir no estabelecimento de exames nacionais cada vez
mais frequentes e desde o 1º ciclo.
Para este debate vale a pena recordar que o Relatório da
OCDE de 2012 “Reviews of Evaluation and
Assessment in Education” relativo a Portugal, citei-o neste espaço referia uma
excessiva centração da avaliação na dimensão sumativa. Como muitas vezes tenho
referido, não creio que mais exames, só por si, fomentem qualidade, tal como o
Relatório da OCDE reconhece.
A qualidade promove-se, é certo, com a avaliação rigorosa e
regular das aprendizagens, naturalmente, mas também com a avaliação do trabalho
dos professores, com a definição de currículos e metodologias adequadas, com a
estruturação de dispositivos de apoio a alunos e professores eficazes e
suficientes, com a definição de políticas educativas que sustentem um quadro
normativo simples e coerente e modelos adequados de organização e funcionamento
das escolas, com a definição de objectivos de curto e médio prazo, etc.,
aspectos que o Relatório da OCDE também sublinhava.
Parece-me ainda interessante a afirmação também constante no
Relatório de se desejar um modelo de ensino centrado no aluno e em que este
seja envolvido no planeamento e organização do trabalho. O Professor Nuno Crato
vai certamente achar uma ideia muito “eduquesa”, os alunos estão na escola para
trabalhar, para aprender e para fazer exames não para esta deriva
construtivista de se envolverem no processo de ensino e aprendizagem.
Ainda sobre a avaliação, recordo algumas passagens de opiniões
registadas pelo JN de Paulo Santiago, analista chefe da Direção da Educação e
das Competências da OCDE, e que participará no debate promovido pelo CNE e a
realizar em Janeiro.
“Os exames de 4.º e 6.º ano em Portugal podem ter sido
introduzidos demasiado cedo no percurso escolar dos alunos, tendo
"potencial penalizante" para agravar o risco de reprovação e de
exclusão social”
“... que entre os mais jovens os testes devem ter uma
função de diagnóstico, para permitir a orientação dos alunos e a superação de
dificuldades, retirando o peso de um exame final, com consequências
para o percurso escolar dos alunos”
“a nível europeu apenas existem exames de 4.º ano na
Bélgica e na Turquia, Paulo Santiago sublinhou o potencial de exclusão social
que estes exames podem ter”
"O que mostra a investigação a nível de educação é
que o fator mais importante é a envolvente socioeconómica do aluno: se tem um
quarto para estudar, se tem pais que o empurram para estudar, tudo isso vai
aparecer na nota do aluno. Se o exame é penalizante, no sentido que conta para
a potencial reprovação, a proporção dos que vão reprovar é bastante mais
significativa, e o que isso quer dizer é que o exame pode eventualmente ter uma
função de exclusão social",
“Até aos 13-14 anos o que é preciso é fazer um
diagnóstico sobre a progressão do aluno e refletir sobre os conselhos que se
podem dar para que possa melhorar a sua aprendizagem".
De forma um pouco
marginal a esta questão mas importante, “Paulo Santiago deixou ainda alertas
sobre as escolhas precoces de uma via profissionalizante, sublinhado também o
"potencial de penalização" para a carreira e o futuro dos jovens que
escolhem este caminho demasiado cedo.
Por uma questão de maturidade dos alunos, a OCDE entende
que essa escolhe nunca deve ser feita antes dos 14, 15 anos.”
Julgo de facto que
é uma questão a debater com profundidade e sem preconceitos. Não tenho uma
posição fundamentalista contra os exames, duvido da sua justificação no 4º ano,
mas também tenho a maior das convicções que uma avaliação basicamente centrada
em produtos, exames por exemplo, é insuficiente para introduzir mecanismos de
correcção eficazes no trabalho de alunos e professores.
Com este objectivo
importa recorrer, também, a uma avaliação dirigida aos processos, ou seja, recorrer
de forma consistente e aprofundada a dispositivos de avaliação formativa.
Também me parece
que o importante debate sobre avaliação deverá envolver outras dimensões como
currículos e programas, organização e funcionamento das escolas, designadamente
recursos e apoios educativos.
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